segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Boca de Camila, digo, de urna

Vera Pinheiro

Levantei cedo para votar ontem. Saí animada de casa para exercer um dos meus direitos de cidadã, o de escolher quem me representará no governo do país, no Distrito Federal, onde moro, na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Minha filha Camila votou antes de mim, logo cedo, em outro local, e depois me acompanhou à seção eleitoral onde voto, próxima do lugar em que moramos quando viemos para Brasília. Hoje estamos no outro lado da cidade, mas continuo votando no mesmo lugar, e aproveito para rever pessoas que foram minhas vizinhas e comer um pão de queijo delicioso na padaria da quadra.

Logo que estacionei o carro e descemos fomos abordadas por um homem que fazia boca de urna a favor de Serra. Ele veio, literalmente, em cima de nós, e não estou exagerando. Agressivo e constrangedor, falava muito perto e gesticulava excessivamente. Seu discurso, porém, era coerente e bem articulado. Digo isso porque, depois que Camila chamou a polícia, o homem alegou aos policiais que era “um homem de Jesus”, se fazendo de louco para passar bem e mentir sobre o que estava fazendo. Dá para acreditar que ele disse que nós pedimos a opinião dele sobre em quem votar? Não dá vontade de esbofetear um tipo desses?

Enquanto ele tentava se explicar com mentiras, outro homem da campanha azul acercou-se e chamou um dos policiais em particular para dizer não sei o quê. Um dos militares me chamou e disse que não estava caracterizada a boca de urna. O que precisava para isso?! Que ele nos acompanhasse até a urna eletrônica? O homem só não foi adiante por duas razões: primeiro, Camila disse que já tínhamos candidatos e que ele se afastasse (e eu não fiz nada!); segundo, porque se dobrasse a esquina seria visto pela polícia, o que não garante que algo fosse feito para contê-lo.

Minha filha queria chamar a polícia na ida, quando eu me dirigia à seção para votar. Pedi que deixasse para lá, não queria confusão. Mas na volta, quando vi o homem abordando e importunando outras pessoas, concordei com Camila, que vociferava contra a boca de urna e fazia um inflamado discurso pela democracia e pelos seus direitos de cidadã. Lá fomos nós denunciar o homem! Não deu em nada, o homem foi afastado do local sob a recomendação de que não abordasse as pessoas.  Para louco não serve, pois cobriu o rosto para não ser fotografado e tirou um santinho religioso da bolsa. Filho da puta, usando Cristo na campanha boca de urna!

Hoje estou deprimida, sinceramente. Quanto mais me informo sobre o resultado das eleições, mais me questiono sobre o caminho que os eleitores escolheram para o uso desse seu direito de cidadão, o de votar e de escolher os dirigentes do país, dos Estados e aqueles e aquelas que irão legislar em seu nome. Que importância as pessoas dão ao voto, que é um instrumento sério de mudança e que não pode ser desperdiçado, ridicularizado e enxovalhado? No que acreditam, afinal? O que querem? O que desejam manifestar com o voto?

Eu, cidadã brasileira, votei segura e consciente do que quero para o meu Brasil e para o Distrito Federal. E vou assim, de novo, para o segundo turno escolher quem vai ocupar a Presidência e a Vice-Presidência da República por mim, em meu lugar.

Levei uma colinha e votei em apenas 27 segundos. Como eu sei? Ora, ora, fiquei de conversa na fila com um moço que, para passar o tempo, se divertia na fila cronometrando o tempo de votação de quem estava à sua frente. Estava atrás dele, mas ele me esperou para me dizer quanto tempo levei na urna eletrônica com aquele barulhinho insuportável (fiquei com dó dos mesários!). Sempre provo o que escrevo para comprovar. Leste a crônica da semana? Pois é. Adoro filas.

Um comentário:

  1. A impunidade impera nesse País, mas acho salutar pessoas como você, agir com determinação, mesmo que o assunto não seja tratato como merece.

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