sábado, 25 de dezembro de 2010

Pedido de Natal (*)

Vera Pinheiro
            O que queres de Natal? O que quiseres para ti dá aos outros e receberás de volta triplicada a tua doação, mas do que deres não esperes qualquer retorno nem a mínima recompensa, tampouco escolhas a quem doar, pois coração generoso não exerce juízo para selecionar a quem transmitir o bem nem tem preferências por quem quer que seja. Dá o melhor de ti neste Natal e a vida te retribuirá em incomensurável e indizível contentamento.

            Dá amor, sobretudo amor, o mais belo dos sentimentos, dotado de extraordinário poder curador e verdadeiro calmante de todas as angústias. Amor que se derrama sobre a humanidade, esparge luz sobre o planeta, cuida das feridas humanas, orienta os espíritos flagelados, mostra o caminho do bem e devolve a paz duradoura e inabalável. Amor que consola os amargurados, ampara os doentes, levanta a autoestima, apazigua os conflitos e alivia os pesares.

            Esforça-te pela compreensão. Aceita as pessoas como elas são, não tentes fazê-las à tua semelhança, porque na fôrma de um não cabe a individualidade inteira de outro, e cada qual deve ter e ocupar o seu espaço. Vislumbra o que há de mais bonito em todos e, paulatinamente, os defeitos deles serão substituídos pela beleza das virtudes, que todos – querendo – podem cultivar.

Aprimora a tua aceitação. Aceita os fatos como eles se apresentam. Sem medo, encara as dificuldades com determinação de superá-las e crê nas próprias forças para resolveres as tuas questões e venceres os desafios que te preocupam. Faz a tua parte para que o convívio seja o melhor possível em todos os lugares em que estiveres. Segura o teu ego para que possam ser contidos os teus gritos de vaidade e para que não queiras sobrepor os teus interesses antes de ver o que é melhor, igualmente, para os demais.

Procura ser solidário. Partilha o sofrimento alheio ainda que nada possas fazer para abrandá-lo. Todos nós temos um caminho para ser trilhado com nossos pés, não com os dos outros, mas isso não impede a manifestação da mais ampla solidariedade. E se nada puderes fazer no sentido material, dá apoio para que alguém se erga sobre seus problemas e não seja por eles soterrado. Lembra-te, no entanto, que não tens domínio sobre expectativas que pertencem a outrem. Se tudo o que puderes dar for um pouco de conforto, pode ser que a tua oferta seja rejeitada. Não desanimes. Há quem precise exatamente disso e mais não queira. Segue em frente, pois, e não guardes mágoa.

Promove a paz em todos os ambientes. A paz não se faz sozinha, ela depende da colaboração de todos. Que haja paz nos corações, nas mentes e nas emoções das pessoas. Que os teus tormentos sejam acalmados e que a paz não seja uma utopia, mas uma realização possível. Pacifica-te, primeiro, e reconcilia a tua alma com as dos teus desafetos. Que teus amigos sejam em maior número do que os inimigos que esbravejam contra ti ou, pior, que tramam em silêncio a tua derrota, sem terem revelado sua face. Entretanto, não contes, de ambos, a quantidade, mas, sim, a qualidade. Verás que alguns opositores fazem por ti muito mais do que aqueles que te bajulam, perceberás que precisas gostar das pessoas para que elas gostem de ti e reconhecerás que a paz não se faz do lado de fora, mas em nosso ser mais profundo. Saberás que alguns amigos fazem o papel de inimigos, tanto te incomodam, mas que eles não sejam capazes de perturbar a tua paz. Cuida bem dela, portanto. Depois, espalha-a por onde andares e que nada a demova.

Se quiseres harmonia, é essencial que te harmonizes. Leva a alegria que tiveres a quem for ao teu encontro. Sorri com facilidade e chora sempre que comovido. Ensina o perdão com atitudes e distribui palavras de ternura, esperança e fé na vida. O aprendizado depende do estágio de evolução individual, mas não desistas do mestre que tu és, sem crer que tudo sabes, pois a modéstia enfeita e a presunção enfeia, além de ser uma ilusão que os tolos têm de si mesmos.

Neste Natal, ocupa-te menos em presentear os que privam do teu afeto e mais em vivenciar o exato sentido da comemoração. Damos o que temos e podemos dar, então, que a tua vida seja farta de valores que elevam o ser humano, que seja bom e nobre o teu coração, e que a tua gratidão por tudo o que tens e és seja tamanha que sejas invadido pela sincera necessidade de compartir o teu notável estado de felicidade.

(*) Crônica publicada na edição de 25 e 26 de dezembro de 2010 do jornal A Razão (www.arazao.com.br) de Santa Maria, RS.
             Que a paz desta noite de Natal esteja sempre conosco, e que nossas vidas prossigam sob a luz divina que desce sobre nós, trazendo-nos múltiplas bênçãos todos os dias.

Gui e Camila, vocês são o melhor presente que a vida poderia me dar.


Rê, sentimos a tua falta, mas estavas conosco no coração. Beijos, amor e fé.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Já volto...

Amadas e amados,
Passaram-se os dias, passou a data do meu aniversário, o Natal já vai passar e este ano também. O que ainda não passou foi a Ceratite que botou os meus lindos olhinhos no prejuízo. Por isso, tenho me ausentado do computador, mas já volto. Aguardem o meu retorno. Estou com saudade.
Beijos.
Vera Pinheiro

domingo, 19 de dezembro de 2010

Desafios do existir (*)

Vera Pinheiro
            Tudo na vida é perfeito e está como deve ser. O Bondoso Pai e a Generosa Mãe, ambos divinos, não se equivocam, não cometem erros, não se enganam e, portanto, não mudam de ideia nos planos que têm para nós. Se Eles traçaram um projeto divinal para as nossas vidas, certamente é o melhor destino o que nos oferecem, não importa que não possamos compreender, dadas as limitações humanas de que padecemos enquanto caminhamos rumo à evolução espiritual, e para isso estamos neste plano terreno de tantos desafios e aprendizados.

            Somos desafiados a todo instante a confirmar a fé que temos na vida, em nós e no sagrado que existe em todos os acontecimentos, por isso o esforço em não sucumbir ao desespero quando as dificuldades nos visitam. Ao compreendermos que a cada problema corresponde uma solução o medo se dissipa. Qualquer questão que dá margem à angústia se resolve com a confiança de que somos amparados em nossas necessidades e que jamais estamos sozinhos nas dores e vicissitudes.

            O desafio do sofrimento não é medir a capacidade de enfrentá-lo, mas não permanecer nele para sempre, ainda que sofrer seja conseqüência natural e óbvia de uma situação grave à qual não podemos ser indiferente e que parece estar além das forças que temos para suportá-la. É quando entra em teste a nossa resistência e, também, o poder de decisão em relação ao estado de ser que escolhemos viver. Como aliada temos a resignação, que demonstra humildade diante do imutável e daquilo que está além de nossas possibilidades alterar para que fique como gostaríamos. Nem tudo está sob o nosso controle e, em sendo assim, a aceitação traz a conformidade, um atalho para a paz.

            Conviver é igualmente desafiador. Em todos os ambientes de que participamos ativamente deveríamos nos posicionar como observadores do comportamento próprio e alheio para extrair incomensuráveis aprendizados, não apenas sobre os outros, mas, principalmente, a respeito de nós mesmos, de como somos e a extensão de nossas ações e reações. Vislumbraríamos, então, quão melhores podemos ser se não nos deixarmos contaminar por posturas que privilegiam a iniquidade, a vaidade, a arrogância, a maledicência, a perversão e tudo o que desbota a natureza humana e a enfeia. Se podemos aperfeiçoar gestos e atitudes, somos capazes de retocar a índole, com uma firme contenção de tendências e propensões malignas e indignas, prejudiciais a todos e mais dolorosamente a nós mesmos, porque tudo o que vai, volta ao ponto de saída com a força do bumerangue existencial, que prima por recompensar e retribuir o que fazemos, e de forma triplicada. O desafio é não esperar ser indenizado por ter sido bom e justo, isso é apenas o mínimo do que cada um tem obrigação de ser.

            Amar é um enorme desafio. Amar com o coração inteiro, com as melhores emoções, com o olhar compreensivo, com magnanimidade, com as mãos estendidas para acolher o outro nas horas boas e nas nem tanto, com risos fartos e lágrimas compartilhadas, com alegria por estar junto e com admiração, com benevolência e valentia para defender-se e à pessoa amada, dedicando-lhe ternura e afeto, aconchego e motivação para estar junto por todas as felizes razões do amor correspondido na mesma inteireza. Amar é desafiador por  exigir desprendimento, independência, interesses comuns, partilha, confiança mútua, respeito e preservação da identidade a fim de que cada um possa dar a sua parte para formar um par, e já não serão dois, mas devem manter-se como indivíduos que continuam sendo.

            O maior desafio do existir é ser feliz. Encontrar motivos para felicidade é realmente desafiador, já que para o sentimento contrário se multiplicam causas. O que precisamos entender são os propósitos para os quais fomos criados. Que Pai e qual Mãe escolheriam direção infeliz para seus filhos? Sendo o casal divino os nossos pais amorosos, não nos conceberiam para a eterna experiência da desventura. O desafio é orientar o nosso livre arbítrio para rumo que nos conduza à felicidade. Decisão de ser feliz inclui julgar-se merecedor e tudo fazer para que o caminho trilhado seja de plena luz a cada passo. Porque, se depender de destino divino, tudo o que vem de quem nos deu a Vida, é bom, é um bem e é sagrado. Então, tudo está conforme deve ser. Aceitemos o desafio de ser feliz e elevemos uma oração de gratidão por tudo o que nos é dado viver.
           
               
(*) Crônica publicada na edição de 18 e 19 de dezembro de 2010 do jornal A Razão (www.arazao.com.br) de Santa Maria, RS.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Colírio para os meus olhos

Vera Pinheiro

Há dias ando com uma irritação nos olhos. Parece areia! Por conta disso tenho chorado lágrimas copiosas, no melhor estilo Melina Gouveia, que só chora na novela das oito. Basta jogar luz e câmera em cima que ela chora. E sem borrar a maquiagem, que deve ser de plástico, uma coisa. Quero saber a marca.

Hoje fui à oftalmologista que me trata desde, ah, sei lá, desde que estou em Brasília ou quase isso. Estou com Ceratite, sabes o que é isso? Uma inflamação na córnea. Pode ser tratada com curativo oclusivo ou lente de contato terapêutica, e antibiótico local. Amanhã vou fazer mapeamento de retina e topografia corneana. Ok, até aí tudo bem.

Com a receita em mão, saí do consultório – um das maiores clínicas oftalmológicas de que se tem notícia - e fui à farmácia comprar colírio e uma pomadinha para colocar nos meus lindos olhos. Não consegui comprar os medicamentos. A médica me deu a receita, mas nenhuma farmácia quis me vender os remédios, porque a receita não tinha duas vias, e o colírio receitado é um antibiótico. Como sabemos, agora só se pode comprar antibiótico com receita, mas a médica não se lembrou da norma da ANVISA que determina que os medicamentos só podem ser vendidos com a apresentação de duas vias da receita médica, sendo que uma delas fica com o estabelecimento e outra com o consumidor. Eu também não me lembrei do detalhe das duas vias. Resultado: fiquei somente com o diagnóstico, não estou medicada. Amanhã terei de voltar à médica para regularizar a receita. Bah, estou aborrecida com a situação!

E o que mais me chateia é que, quando se é jovem, uma irritação nos olhos a gente cura com umas gotinhas de lavolho, benzedura e preces para Santa Luzia. Quando cruza aquela faixa em que já se está com um pé na chamada melhor idade, uma irritação nos olhos se torna um problemão. Ah, vá! Coisa mais sem graça...

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

A casinha do cãozinho

Vera Pinheiro
Alguém se lembra do cãozinho que deixaram na minha casa e que ninguém procurou, apesar dos meus esforços para devolvê-lo ao seu dono? Isso foi em julho passado, na época do frio. Vejam em http://blog.verapinheiro.net/2010/07/05/ o que escrevi quando ganhei “Mais um filho canino”, e também em http://blog.verapinheiro.net/2010/07/08/, quando falo do “Meu novo lindão”. Tudo no antigo blog (http://blog.verapinheiro.net), que lotou e me fez migrar para este blogspot.

Pois, então, o meu Baby – nome dele com a terminação familiar em Y – hoje, seis meses depois, está um mocinho muito esperto. O veterinário disse que ele tem idade aproximada de 12 a 13 anos, velhinho, portanto. Dengoso que só! Carinhoso a mais não poder.  Ele não foge, ao contrário da matilha, com exceção de Placky, que não escapa. Ao abrir o portão, Baby fica na varanda, acompanhando a movimentação, mas sem pegar a rua. Às vezes, dou caroninha para ele na saída e na entrada para premiar o seu bom comportamento. Bom, não. Excelente!

O problema dele era apenas com a chuva,  os raios e trovões e fogos de artifício (coitado dele no Natal e no Ano Novo). Se chove, Baby abandona a matilha e fica de plantão na porta de casa. Não sei se ele quer me proteger ou se está com muito medo e quer companhia.

Para resolver isso, numa dessas noites chuvosas, montei uma casinha numa caixa de papelão. Ele é tão pequenininho que cabe numa caixa de sapato! Forrei a caixa com panos e deixei perto da porta da cozinha, num lugar abrigado. Ele gostou e passou a dormir ali nas noites de chuva, mas achei feio e resolvi comprar uma casinha de madeira. Nossa! O cãozinho adorou a casinha e tem dormido ali todas as noites. Acho que ele pensa que me protege, embora lhe falte tamanho. O que não lhe falta é goela, porque late demais ao menor barulho. É um cão de guarda o meu pincher. É um pequerrucho, mas se acha! E eu boto a maior fé nele. E desde quando tamanho é documento?!
 
Não, nenhum cãozinho da casa ficou enciumado com a nova casinha dele. Ninguém lá em casa é dado a ciúmes. A gente só não gosta de provocação... Se acontece, a gente rosna feio!
Lindeza da mamãe está de casinha nova!

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Ai, ai do fim de semana

Vera Pinheiro

Quando eu jovem (não faz muuuuuuuito tempo, claro), gostava muito de baile. Naqueles idos a gente ia a baile, que hoje tem outros nomes. Balada é um deles. Pois, então, na sexta-feira fui para a balada. A causa era nobilíssima: a despedida do Dr. Amaury Teixeira Machado, Assessor de Comunicação Social da Vice-Presidência da República. O pessoal da VPR fez um Happy Hour num lugar ótimo, com música ao vivo. Samba, gente, samba! Quem resiste? Caí na farra! Dancei até me acabar! Não dizem que dançar é bom para pressão alta? Deve ser mesmo, porque a minha pressãozinha, que andava maluquete, entrou nos eixos. Nem sei onde coloquei o remédio. Sério!

No bom da farra, saí dessa festa e fui a um jantar maravilhoso em excelente companhia e com um grupo ótimo! Voltei tardão para casa. No dia seguinte, levantei cedo e passei o sábado no meio do mato, com os pés no chão e tomando banho de cachoeira. Uma delícia. Vim bocejando para casa, rumo à cama. A alma estava lavada mesmo.

Domingo é dia de faxina em casa. A escolha desse dia é da faxineira. Eu acho bom, porque tenho mais o que fazer no sábado. Só que eu pego no pesado junto com ela. E ontem, além da limpeza geral, me esperavam um tanque cheio de roupas, carro para lavar e capina no quintal. Nada como um tanque de roupas para lavar na munheca para a gente esquecer de qualquer preocupação. Fiquei com a cabeça novinha em folha, mas me prometi que não vou comprar roupas que não possam ser lavadas na máquina.

Depois de toda a maratona, a conclusão óbvia: ai, ai, estou na idade do condor. Dói tudinho nesse corpinho. Mas não foi do serviço, não. Foi do baile! Estava enferrujada.

Lembrei de minha mãe. Quando eu ia a um baile e no dia seguinte me queixava de cansaço, ela fazia uma perguntinha que me botava de novo no batente:
-         “Estás cansada assim de trabalhar, minha filha?!”.
-         “Não, mãe. Estou ótima. No que a senhora quer que eu lhe ajude?”.

Punto e basta! Não se fala mais nisso.


Dr. Amaury na despedida da Vice-Presidência da República.
Rita Helena Custódio Fragale, amiga, colega e "promoter" de muito sucesso.

sábado, 11 de dezembro de 2010

Provas e provações (*)

Vera Pinheiro
            Nós passamos a vida inteira tentando provar aos outros o que somos, como somos, por que somos e agimos de determinada maneira. Buscamos, com isso, nos impor, situando-nos perante os demais e, também, ser validados pelos grupos de nossa convivência, aos quais solicitamos legitimação que consideramos essencial e não dispensamos. Mesmo que pareçamos insensíveis ao juízo alheio, queremos conquistá-lo ou dobrá-lo. A ideia é marcar território, dizer a que viemos e, assim, sugerir que melhor nos conheçam para que nos admirem, mas, se não puderem ou não quiserem fazê-lo, que nos aturem, pois não pretendemos arredar pé do que escolhemos ser e viver, ainda que isso nos custem confrontos e muitas lágrimas.

            Na mais tenra idade, queremos provar que não somos crianças e que podemos diminuir as proibições e alargar as permissões, fazer coisas por nós mesmos, sem a supervisão de um adulto. Porém, não estamos preparados para assumir todas as responsabilidades que advêm da liberdade. Queremos desfrutar sozinhos os acertos e as vitórias, mas entregamos os erros para que os mais velhos os corrijam. Isso não é fuga, mas impossibilidade de resolver questões que estão além da nossa competência.

            Vivemos com sofreguidão a adolescência, ansiando que o tempo corra e que sejamos adultos logo, para não precisarmos provar a ninguém que somos jovens, mas podemos assumir a nossa vida sem conselhos que não pedimos e alertas que julgamos desnecessários. Passamos a provar que, mesmo com pouca idade, merecemos um voto de confiança e encargos cada vez mais exigentes, embora nos deparemos com descrédito, e fazemos tudo para não lhe dar razão. É preciso vencer o desafio de ser jovem demais, mostrando dons, aptidões e conhecimentos já que, nessa etapa, não temos experiência a exibir.

            Alcançamos a idade adulta com saudade do tempo em que não tínhamos tantos compromissos e sobrava tempo para resolver o mundo por nossa conta e risco, a qualquer custo. Queremos provar que ainda nos resta frescor e viço, enquanto ganhamos idade, e que o passar do tempo não nos é desfavorável. Pelo contrário, consideramos o tempo um aliado, até porque não adianta tê-lo como inimigo, já que a pose de implacável é dele, e a nós cabe a postura de não vítima. Provamos, então, a sabedoria adquirida aos poucos, sorvendo lições de tudo o que nos acontece. Comprovamos de que fibra se compõe a nossa altivez diante das dificuldades, quanta força e coragem há no farnel que carregamos durante a caminhada rumo aos objetivos, sonhos e desejos. Já provamos que somos capazes, agora queremos provar que somos indestrutíveis naquilo que levamos uma vida para construir, e a que sacrifícios!

            A velhice nos exige provar que vivemos bem até nos encontrarmos com ela, que conseguimos manter a saúde boa e que temos condições de provar que esta é, mesmo, a fase da “melhor idade”. Tornando-nos idosos, comprovamos se fizemos tudo certo em relação à família e à profissão, que sabemos parar na hora certa, e que podemos, enfim, nos recobrar de todos os esforços empreendidos e desgastes sofridos ao longo da extenuante jornada. Tomamos consciência de que nem tudo depende de nós, que muitas situações acontecem à revelia do nosso querer, que diversas circunstâncias prescindem de nosso comando, que efetivamente não podemos exercer controle sobre tudo em torno, tampouco sobre todos, como tentamos provar que podíamos fazer sem padecimentos, apenas por doação e zelo. Tentamos provar que aceitamos ser dispensáveis e que agora podemos colocar em prática vários projetos pessoais exclusivos, intransferíveis e inadiáveis, e que seremos, doravante, prioridade máxima em nossos quereres.

            Entre provas e provações, a vida passa. Provamos que a compreendemos quando superamos as vicissitudes e fazemos dos problemas um aprendizado. Provamos que temos fé se não desesperamos diante de riscos iminentes e confiamos na providência divina. Provamos que as dores importam menos que a felicidade, ainda que tardia. Provamos que não há solidão enquanto houver uma mão amiga a amparar nossas angústias. Provamos que tudo o que vivemos valeu a pena se não há motivos para arrependimento ou mágoas, e que o perdão substitui a amargura. Provamos que o amor existe se ele ocupa espaço que seria do ódio e da indiferença. E provamos que não precisamos provar nada se temos convicção de quem somos.

(*) Crônica publicada na edição de 11 e 12 de dezembro de 2010 do jornal A Razão (www.arazao.com.br) de Santa Maria, RS.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Pedido de casamento

Vera Pinheiro
Sempre que entro sozinha em supermercado me arrependo por não ter levado uma companhia para me ajudar a carregar as compras e pagá-las, claro. Na pressa – sempre vou às pressas – acabo me esquecendo da lista que fiz ou pensando por que não fiz uma lista do que preciso. Compro o essencialmente necessário para pegar a fila rápida, que atende quem tem até 10 itens no carrinho.

Foi assim que peguei pão de multigrãos, manteiga sem sal, queijo, uma dúzia de ovos, ração para cães e gatos e maçãs. Só isso. Parei no caixa atrás de um moço mais ou menos jovem. Acho que ele tinha menos de 40 anos. Cabelos escuros e pele bem clarinha, roupa escura, tênis. Na vez dele, tirou do carrinho e colocou sobre o balcão pão de multigrãos, manteiga sem sal, queijo, uma dúzia de ovos, ração para cães e gatos e maçãs. Sim, exatamente o que eu comprei. Eu podia ver as compras dele, mas ele só poderia ver as minhas se virasse, e ele estava de costas para mim.

Não agüentei e comecei a rir na fila. A moça do caixa me olhou e ele também, ao que eu disse:
-         Moço, o senhor acaba de encontrar a sua alma gêmea!

Disse isso e, de pronto, apontei para as minhas compras. Ele arregalou os olhos e sorriu quando viu a coincidência (e eu não acredito em coincidências). Continuei chamando-o de senhor para que ele visse que se tratava de uma brincadeira.
-         Preste atenção: nossos gostos são os mesmos, nossas necessidades também. Compramos tudo igual! Isso não acontece duas vezes na vida! O senhor quer casar comigo?

O rapaz, visivelmente encabulado, apenas sorria. Fiquei com pena dele.
-         Olha como são as coisas. Eu lhe peço em casamento e o senhor não diz nada?!
-         Eu bem que queria aceitar, mas não posso.
-         Não pode por quê?
-         Porque já sou casado.
-         Não tem importância, eu não me importo. Posso ficar no cadastro reserva.

Ele pagou as compras, botou no carrinho e se aproximou de mim para me dar um abraço e um beijo no rosto.
-         Você é ótima, disse ele.
-         Eu também acho.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Sem tempo

Vera Pinheiro
Amadas e amados, as coisas estão acontecendo numa velocidade tamanha que já estou cantando "Adeus Ano Velho, Feliz Ano Novo". Mal sei que dia é hoje e já é ontem. O amanhã... que amanhã? Ele já chegou e já foi.

Pedi um homem em casamento nesta semana. Está rindo de quê? Não posso?! Não devo? Pois pedi. Ele não aceitou. Uma pena para ele.

Assim que eu tiver tempo vou contar aqui. Esperem por mim... e tenham comigo aquilo que não me sobra: paciência!

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Susto no banho

Vera Pinheiro
 Vivi uma cena cinematográfica ontem, quando estava no recesso do meu lar, doce lar. Sozinha em casa, esperei realizar todas as ligações telefônicas, as dadas e as recebidas, para então tomar o banho noturno e cair na cama para dormir como uma santa, sem dívidas nem pecados. Como uma princesa, melhor dizendo. Vai que eu sonhe com um sapo. Sempre existe a possibilidade de que ele se transforme em um príncipe encantador e que ocupe o lugar que hoje é do meu gatão. Estou falando do Happy, que assume o lugar vazio ao lado do meu travesseiro, posando de marido, e ninguém o tira de lá. Ainda bem que eu não confundo os pelos nem os bigodes...

Pois lá pelas tantas, fui para o chuveiro. Hummmm, que delícia aquela água morninha caindo sobre a pele e eu pensando em nada, me refrescando... Parecia estar numa propaganda de sabonete, bela e feliz.

De repente...Catabum! Um trovão daqueles que faz a gente se esconder embaixo da cama e correr para o urinol. Ah, os jovens não sabem o que é um urinol.Quem se lembra daquela peça branquinha, cujo conteúdo a gente jogava fora de manhã cedo? Ai, deixa quieto esse saudosismo absurdo!

Um corisco cortou os céus e pude ver a faísca pela janelinha do banheiro e antes que o próximo trovão viesse... a luz apagou. Eu, nua, no chuveiro que começava a esfriar, e ainda ensaboada. Não tive dúvidas! Dei com a mão na porta do Box e voei para o lado de fora. O coração estava aos pulos! Que susto!

Pelada e no escuro, fui atrás de velas que, graças à minha fantástica organização, sempre sei onde tem, como tudo em casa. A luz voltou quando eu já estava na cama, no quinto sono. Depois do caso passado, uma decisão: tomar banho de chinelinhos de borracha, tipo havaianas.

Não sei se me livra do perigo no caso de estar no banho e acontecer o mesmo de ontem, mas pretendo adotar essa medida de prevenção.

Ah, sim. O chuveiro ficou ligado até que eu colocasse os pés em um chinelo de borracha. Levei um susto, sim, mas tratei de me acalmar logo. Só não me lembro se gritei. Acho que sim, porque a cachorrada correu para a porta para me acudir. Ufa, passou.

domingo, 5 de dezembro de 2010

Humanidade cruel

Vera Pinheiro

Até que ponto a gente pode dizer tudo o que sabe e tudo o que sente? Até o limite imposto pela sensibilidade do outro, eu acho. A minha sensibilidade é muito aguçada e por isso, não raro, me machucam as palavras, juízos e opiniões alheias. Não é sempre, mas acontece. E acontece quando levo a pessoa em consideração, senão passa batido. Para quem não importa, o fodômetro está sempre ligado. To nem aí.

Não entendo por que as pessoas não fazem uma breve, que seja, reflexão, sobre o que vão dizer e avaliar por um instante se isso não vai magoar alguém.

Mas, nããããão! O povo abre o bocão sem dó nem piedade! Diz tudo o que sabe, tudo o que sente e, não bastasse isso, ainda reproduz o que os outros disseram de ruim a nosso respeito. Que merda é essa?!, diria Guigui, um gurizinho filho de amiga minha. Pois é. Que merda é essa que faz as pessoas tão cruéis?

Conheço gente especialista nisso! E por que elas me contam o que eu não gostaria de saber, o que não acrescenta nada de bom à minha vida e o que, definitivamente, não me faz feliz? Talvez por acharem que vou dar conta, que não vou me importar. Sim, há pessoas que pensam que eu sou de ferro. E às vezes sou de aço, mesmo! Preciso ser.

O meu código de conduta pessoal diz o seguinte: vou magoar alguém se contar para ela o que sei? Se a resposta é positiva, me calo. Para quê contar se ninguém vai ficar feliz com isso? Esse é só um dos exemplos em que o silêncio, realmente, vale ouro.

Depois que aprendi a silenciar sobre mim e sobre os outros passei a ajudar a construir a paz, minha e alheia. E cá pra nós, por que a gente precisa saber de certas coisas? O que isso vai contribuir para a nossa vida e para as nossas relações? A ignorância, em alguns casos, é uma bênção! Ignorar, não saber, é melhor, em alguns casos. Eu preferia não saber algumas coisas que dizem sobre mim. Não me contem, por favor. Contem apenas a parte boa! O que não presta eu dispenso, e isso vale para tudo!

Ainda bem que tudo passa. Isso também vai passar e amanhã será apenas mais uma lembrança. E uma lição de como não fazer. Faço questão de aprender com tudo o que vivo de bom ou nem tanto. Uma dica boa que as pessoas deveriam lembrar é: se fizessem isso comigo, como eu me sentiria? Colocar-se no lugar do outro nos faz desviar da prática de qualquer maldade.

Jamais quero ser má ou cruel. Quero crescente a minha humanidade, e que ela jamais seja cruel como, às vezes, são comigo.

sábado, 4 de dezembro de 2010

Homens reparam, sim! (*)

Vera Pinheiro

Sempre achei que as mulheres são reparadeiras, mas estou começando a mudar de opinião para atribuir aos homens também o hábito de reparar na vida alheia. O detalhe é que o termo “reparadeira” é substantivo feminino que significa “mulher que repara em tudo, que tudo olha”, e não há correspondente masculino na Língua Portuguesa. Pode uma coisa dessas? O substantivo masculino “reparador” significa outra coisa: “Que ou aquele que repara, que melhora, ou fortifica”. Assim, reparar não tem a ver com a questão, mas com refazer, restaurar, consertar e outras palavras assemelhadas. Mas posso garantir: os homens reparam, sim! E muito! Talvez até mesmo mais do que nós, mulheres, o fazemos. Ou tanto quanto.

          Nesta semana, eu almoçava no restaurante do serviço com três colegas. Como sou lerdinha para fazer as refeições (ainda bem, porque isso é mais saudável do que a pressa), demorei a terminar o meu almoço e as três, precisando retornar às suas atividades, saíram da mesa antes de mim. Sentaram-se, então, dois homens, um de cada lado da mesa e eu na cabeceira, onde costumo me acomodar para ter melhor visão do espaço onde me encontro. Tal e qual os homens, gosto de ficar com a parede às costas, e quando vou a um restaurante com um deles quase disputo essa posição de resguardo, mas me controlo e dispenso o privilégio da localização no ambiente. Afinal, homens ficam inseguros com gente às costas. Isso é um comportamento masculino ancestral para se prevenir de ataques pela retaguarda. Quem deseja comprovar, basta fazer com que eles se sentem de frente para a parede e de costas para o público e observar como ficam inquietos e desconfortáveis na cadeira. 
    
            A conversa começou e a primeira pergunta de um dos homens foi curiosa: sobre o meu carro. Hã? Quase engasguei com o osso do peixe, mas me recompus a tempo de responder, engolindo a questão “Por que, raios, ele quer saber isso?”. Como entro em assunto de carro com um homem que, provavelmente, sabe muito mais do que eu? Estará me testando? Aaaah, que desafio bom!

            Num átimo, lembrei de todos os manuais de automóveis que já li para reunir um cabedal de conhecimento próprio. As reportagens sobre carros passaram na minha cabeça num instante e, igualmente, as opiniões masculinas, principalmente as do meu filho, que verdadeiramente levo em conta, sobre a matéria.

            Falei com propriedade, desculpem a falta de modéstia. Qualidade dos pneus, desempenho do motor, espaço interno, design externo, mecânica, estabilidade, agilidade, economia, conforto e itens tecnológicos. Depois, falei das frescurinhas que a gente, mulher, adora: porta-trecos, espelhos, cores, assentos aveludados, acessórios e utilidades etc e tal. Foi nesse ponto que os dois homens retomaram o assunto para dizer que a indústria automobilística se preocupa com detalhes que encantam as mulheres porque elas se tornaram grandes compradoras. E eu não sei? Sei, mas deixei que eles falassem. Afinal, enquanto eu discorria sobre carros os dois se calaram. Ambos estavam boquiabertos, com os garfos paradinhos no ar e os braços apoiados na mesa.

            No entanto, a prosa não acabou nisso. Quando, enfim, respirei e lhes dei a palavra, um deles diz ter reparado que o meu carro está sempre muito limpo, apesar do tempo chuvoso em Brasília nesta época. “Como é que ele viu?!”, pensei. Nunca cruzei com a pessoa fora do ambiente de trabalho e sequer o vi no estacionamento onde tenho uma vaga fixa. Será que ele reparou nisso também?! Quem mais repara em quem?

            Daí, então, a conversa convergiu para o que os homens, em geral (com as honrosas exceções que confirmam a regra), adoram: lavar carro. Acrescente-se o olhar desvanecido deles quando o trabalho termina e pode ser contemplado com verdadeira idolatria... e a última passadinha de flanela para alcançar um brilho extra na lataria onde é possível espelhar o sorriso de satisfação. Eu faço isso! Trocamos informações a respeito e não me neguei a repassar as dicas que um lavador de carros me ensinou. Eles questionaram, ainda, como mantenho as unhas arrumadas, no que também repararam. Aí não pude explicar, porque certas coisas só uma mulher sabe quanto esforço custa! Homens não entenderiam.

(*) Crônica publicada na edição de 4 e 5 de dezembro de 2010 do jornal A Razão (www.arazao.com.br) de Santa Maria, RS.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Colheita farta

Vera Pinheiro
Lá em casa tudo dá, uma maravilha! Os coqueiros deram cocos, as mangueiras darão muitas mangas, a romãzeira está dando romãs e a caramboleira dá carambolas o ano todo. Quantas bênçãos da natureza para o meu recanto!


No fim de semana eu e Camila subimos na romãzeira para colher os frutos maduros e eu fui premiada com uma romã na testa! Tóim! Doeu, claro. Mas o sabor da fruta vermelhinha, vermelhinha, era delicioso. Compensou o esforço, mas o fato é que eu preciso – urgentemente – me equipar para a colheita para não precisar trepar nas árvores. Ainda bem que são baixinhas e posso pegar os frutos com a mão. 

Pensa numa romã do tamanho da mão caindo na minha testa...

 


 A colheita será farta lá em casa neste final de ano. Os cachorrinhos já estão se fartando das mangas maduras. Tudo é tão bom, tudo é tão belo na natureza! Eu me desvaneço, cheia de gratidão.
É o cão chupando manga!
   

Meu coqueiro já dá cocos!



segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Gafe!

Vera Pinheiro
Gafe é um acidente de percurso quando a gente sabe como proceder, mas a mancada é inevitável, simplesmente escapa. É um incidente que seria possível evitar, não fosse uma distração qualquer e... putz, já era. O que fazer? Nada a fazer. Se não der pra sair correndo rua afora, permanece, congela e encara a situação com a maior cara de “sinto muito, foi mal”. É melhor não tentar explicar a gafe, pois geralmente a agrava. Deixa quieto e espera que se esqueçam do acontecido.

          Hoje eu almoçava num restaurante self service. No início eu estava só, mas depois se sentaram um homem e duas mulheres. Conversavam animadamente à mesa e eu, quietinha na cabeceira, afinal, a conversa não era comigo.

          Lá pelas tantas, o coitado do homem está cortando a carne quando um pedaço voa fora do prato. Já aconteceu isso contigo também? Pois é. O pedaço quase parou no meu prato, tirou um fininho, mas passou rápido demais e... escanteio para o naco da bisteca do cara! Ele nem viu onde ela foi parar: coladinha nos meus pés. Mas eu não ia juntar do chão e perguntar: “É seu?”. Fiz que não vi e continuei comendo como se nada tivesse acontecido. Segurei o pranto de piedade pelo homem... e o riso. Pensei em contas a pagar, porque não tem coisa que me faça ficar mais séria do que isso. Broxadas que testemunhei me fazem rir, então nem penso nisso, senão ninguém me segura. Passo mal.

Espiei com o rabo do olho e vi o vermelhão intenso da cara dele. Tadinho. Ele se ocupava em recolher o arroz que fugiu do prato para a mesa, tudo esparramado sobre a toalha. Por que não chamou o garçom? A pior coisa é tentar consertar com as próprias mãos. Aquilo também!

Logo saí dali e fui para a fila pagar o meu almoço. Na fila ao lado, pessoas se serviam de café. Dali a pouco, uma mulher de uns 40 e poucos me olha e começa a fazer uma cara estranhíssima! Parecia querer dizer: “Fiz merda” ou “Fodeu geral”. Longe de mim pensar que a culpa fosse minha ou que aquela cara de quem vai começar a chorar tivesse a ver comigo. O problema é que ela olhava de um jeito muito estranho mesmo. Eu não sabia se falava com ela para perguntar se ela estava passando mal e precisava de ajuda ou se me calava, ou, talvez, ela houvesse soltado um pum na fila e queria disfarçar. Ah, vai saber os problemas por que passa um ser humano!

Parecia estar engasgada e eu já estava para cair de tapas nas costas dela quando um garçom passou no meio das duas filas e ela, finalmente, se atreveu a falar. “Moço, fiz uma coisa...”. Será xixi nas calças? Só pensei, claro, e continuei quieta, observando a cena. Ai, meus sais, por que as pessoas não vão direto ao assunto? Será que precisam mesmo das preliminares?

“Tudo bem, senhora. Eu dou um jeito nisso”. O garçom foi o máximo! Nem esperou que ela mostrasse o que fez, já entendeu tudo. Vai ver não era a primeira que desmontava a máquina de fazer café a jato...ou sei lá como se chama aquela cafeteira. Eu ainda prefiro que me sirvam café na mesa.

Não ouvi a mulher agradecer, mas espero que o tenha feito. Ei, volta aqui e te desculpa por teres me olhado com aquela cara de “socorro!”. Não gosto de levar sustos, porra! Nem posso!






O café derramado.


Como será que ela fez isso?!


O garçom deu um jeito e eu tirei uma foto!

domingo, 28 de novembro de 2010

A sós

Vera Pinheiro
Todo mundo devia ficar a sós (um pouco, ao menos) para cultivar a própria companhia e saber como anda a relação íntima consigo mesmo. Ficar, estar ou ser só amplia o autoconhecimento, obriga a descobrir quem a gente é – ou o quê – e a se confrontar com a identidade do ser.

Eu preciso de alguma solidão, às vezes. Ela me faz bem. E diria que ela me é necessária.

Quando dou folga de mim às pessoas, ou se elas me dão folga, eu me recolho e me contemplo. Vendo-as de longe, geralmente mais desejo manter a proximidade. Ou não, em alguns casos. O afastamento e a solidão mostram quem e o quê realmente importa, quem e o quê nós queremos. 

Um dos problemas do convívio é não haver saudade. A saudade desvenda os mistérios do desejo. Se não sentimos saudade não temos razões para ficar perto.

Preciso ficar só para entender isso, às vezes. Mas a saudade que me consome, também às vezes, não tem o poder de trazer de volta quem partiu ou quem não quer voltar. E a vida segue, entre ausências, despedidas e solidão contemplativa.

Não é tão ruim ficar, estar ou ser só. Eu até gosto...

sábado, 27 de novembro de 2010

Os instrutores (*)

Vera Pinheiro
            Vive a tua vida de modo que não precises franzir o cenho por contrariedades. Que não te falte a serenidade que amaina a forma de encarar os acontecimentos e permite resolver os problemas sem aflições. Que o teu olhar seja manso, suave e iluminado de contentamento. Que não se inquiete o teu espírito perante as dificuldades e que elas sejam reais oportunidades de aprendizado. Que as tuas palavras sejam temperadas de doçura e que a tua voz não se eleve além do tom de uma carícia, mas sê firme no que dizes, e seguro do que expressas até mesmo com o silêncio.

            Não permitas que outras pessoas comandem as tuas vontades. Só tu podes – e deves – ser dono de ti mesmo, do que queres para o teu destino e o único responsável pela maneira como escolheste viver. Exerce pleno domínio sobre as tuas atitudes e te sentirás fortalecido. Procura conhecer-te ao máximo para que as tuas reações não sejam imprevisíveis ao teu conhecimento e para que possas esquivar-te das ciladas e dos perigos que tu mesmo podes, inadvertidamente, armar.

Não te deixes embalar pela vaidade, que cobre de ilusões o teu auto-retrato e o faz muito diferente do que, na realidade, és. Cuida da tua essência para que ela se mantenha íntegra e não se esfacele com apelos que são o vazio disfarçado de alegria. Não esperes lucros fáceis nem vantagens que não venham com o trabalho de cada dia e a dedicação somada a esforço. Desconfia de garantias de sucesso sem custo e observa se o pagamento, em troca, não será a entrega da tua alma, começando pela perda de valores. Não te deixes corromper e vigia o teu comportamento para que ninguém faça a vigilância que te cabe. Nada faças sem a aprovação da tua consciência, e que ela seja transluzente.

Ousa na medida da confiança que tiveres do que podes fazer na circunstância que exige que sigas em frente ainda que não conheças bem o caminho. Avalia as possibilidades, mede os riscos e toma os cuidados necessários para que todos os resultados sejam benéficos, ainda que eles contrariem as tuas expectativas.

Evita os derrotistas e os invejosos, e não gastes teus argumentos para convencê-los de que devem agir em sentido contrário. Não há o que fazer por quem não quer fazer por si e o crescimento individual se dá no ritmo de cada um. Não te desgastes em aborrecimentos pelo que fazem contra ti, entrega tudo à perfeita ordem do universo e ela se encarregará de responder aos teus algozes. Jamais queiras o que pertença a outrem. Busca por teus méritos o que desejas sem prejudicar quem quer que seja, para que não geres um débito futuro com a vida, e ela te cobrará inapelavelmente todo o mal que praticares assim como te recompensará generosamente por todo o bem que tu fizeres.

Não te revoltes com pessoa que, a um olhar distraído e de pouca sabedoria, pareça estar no mundo para te causar desagrado e por quem nutres antipatia que não é gratuita por ser, aquela criatura, muito hábil em tirar a tua paciência. O que nos causa repugnância é um instrumento para a nossa evolução e aquele a quem rejeitamos, com ou sem razão, atua como instrutor do nosso processo evolutivo, verdadeiro mestre que nos ensina virtudes cada vez mais raras como a compreensão e o perdão. Mantém distância sem terceirizar o poder sobre as tuas decisões e sobre o teu humor. Não te empenhes tanto em fazer amigos e, sim, em não colecionar inimigos, pois a ajuda que podes receber por meio de uma amizade não é tão grande como o mal que impulsiona as ações de quem te odeia. Porém, apesar de tudo, não retribuas ódio com sentimento de igual natureza. Eleva-te acima das provocações e das ofensas e não sintonizes com energias densas, que diferem da tua, que a paz habita e a brandura é a maior aliada.

Age em vez de preocupar-te e sorri mais vezes e para quem cruzar contigo. Poucos adentrarão no convívio com o teu ser mais profundo e, assim, nem todos te conhecerão. Então, pode acontecer de que chores sozinho e venças sem auxílio, mas não te amargures pela solidão nem te sintas como um abandonado pela humanidade. A fé preenche o coração e nos põe em contato com forças que nos amparam nos momentos mais difíceis, tenhamos gente por perto ou não. E se tuas feridas emocionais sangrarem, o bálsamo ao alcance da mão é o amor, que se fundamenta na bondade. Ocupa-te, portanto, em ser bom e serás o refúgio em que o amor repousa e vibra, se recompõe e se resguarda para depois se espargir por onde andares.


(*) Crônica publicada na edição de 27 e 28 de novembro de 2010 do jornal A Razão (www.arazao.com.br) de Santa Maria, RS.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Coisinhas inúteis

Vera Pinheiro
 Por que os restaurantes dos shoppings insistem em colocar junto dos pratos um pacotinho de sal e um palito? Coisinhas mais inúteis! Adicionar sal à comida é envenenar as refeições e esgaravatar os dentes com palito é um horror inominável. Será que ninguém da área da alimentação se toca que quem quiser sal deve pedir (ou carregar) e que palitos devem ser banidos da mesa?
 Há tantas coisinhas inúteis, que a gente não precisa e devia descartar. Zangas prolongadas e desnecessárias, raiva pelo que não tem solução, angústia por aquilo que não depende de nós, ansiedade pelo que ainda não aconteceu, temores amplos e gerais pelo que não sabe e não tem como saber.

Nessas horas é valioso fazer uma avaliação do que é inútil e do que é necessário viver, e manter o autocontrole para não perder a capacidade de discernir os fatos. Serenar e depois fazer o que se faz com o pacotinho de sal e o palito: deixar de lado. São coisinhas inúteis.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Tensão e chocolate

Vera Pinheiro
Hoje estou com a vó amarrada no toco! Tensa! Hipertensa! Nem eu me agüento! Preciso de um sossega-leão urgente. Não, não estou falando de sexo, mas de uma boa sessão de acupuntura! Ando sem tempo para isso, que é algo que adoro e de que preciso, embora saiba que preciso me dar prioridade.

Hoje, ao meio dia, comi um pratão de salada e um pedaço de carne. Sim, estou de regime. Não, é melhor dizer reeducação alimentar. Aprendi a comer quase tudo sem sal e com isso a reconhecer o verdadeiro sabor dos alimentos. Essa é a parte boa da restrição. Só não quero comer jiló e moranga. Nunca provei jiló e comi moranga demais quando era criança.

Naqueles idos, na casa de minha mãe criança não tinha direito de dizer “não gosto”. Era fazer cara feia para uma comida e a mamita lascava: “Vai comer o que quiser quando tiveres a tua casa”. Foi exatamente isso o que fiz. Nunca cozinhei moranga e quibebe. A minha bronca com jiló não tem nada a ver com a infância, é só antipatia mesmo. Jamais servi miúdos de galinha – ninguém me convence de que coraçãozinho tem bom sabor. Criei meus filhos sem bife de fígado – e eles cresceram bem fortinhos, apesar disso.

Vejo muita criança empurrar o prato e dizer “não quero, não gosto”. Os pais deviam ensinar os filhos a dar graças pelo prato de comida que têm sobre a mesa, lembrando-os das muitas crianças que passam fome.

Minha mãe era durona, mas sou-lhe muito grata por suas lições. E gratidão também é algo que se ensina em casa. Quem não aprendeu gratidão não dá valor para nada.

Como estava dizendo, hoje eu comi um pratão de salada mista (de tudo um pouco), mas me permiti um, está bem, dois bombons. Curou-se rapidinho o meu humor lascado de hoje. Será que sou chocólatra?! Claro que não! Passo muito tempo sem comer chocolate. Aliás, nem gosto de doce, só de pudim de leite condensado. Reeducação alimentar não significa privação de uma das melhores coisas da vida – comer, mas ter hábitos saudáveis que, muito lá de vez em quando, podem ser quebrados por um chocolatinho inocente.

Estou calminha agora...

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Ele foi embora

Vera Pinheiro

Amiga minha está casada há alguns anos e tem um filho de sete. Outro dia, o marido comunicou-lhe que a empresa onde trabalha decidiu transferi-lo para outro estado e que, no começo, até conhecer melhor a cidade, ele iria sozinho. Depois, no período mais apropriado para mudanças escolares, viria busca-la com o menino. Ele foi embora, ela ficou.

Logo começou a estranhar a ausência dele, mas, boa de coração uma barbaridade, creditou o fato à nova etapa, o emprego novo, morando de qualquer jeito, sem ela para ajudá-lo, coitado. Estava acostumada a relevar tudo desse homem por quem era apaixonada.

Os primeiros 15 dias. Ela se revirando na cama, sozinha, a espera dele. Um mês. Bom, vou dar um jeito na vida, arrumar as coisas para mudar em breve. Dois meses, um telefonema. “Oi, amor, vou falar rápido. Estou muito cheio de serviço. Tudo bem com vocês? Mandei dinheiro”. Ah, que lindo, ele todo generoso. Três meses. Por que ele não comprou ainda um celular e por que não dá o endereço para eu visitá-lo?, pensou. Está correndo demais, tadinho. Quatro meses. Eu nem sei onde ele trabalha... Vai ver não quer me preocupar. Ela é boazinha demais mesmo.

Cinco meses depois, ele ainda não apareceu em casa, não deu endereço da empresa nem da moradia e diz não ter celular. Pacientemente, ela espera. Como sempre, aliás.

Um dia, encontrou-se com a cunhada num shopping. “Aparece lá casa pra gente conversar”, convidou a outra. No sábado, ela foi. Tomaram chá com biscoitinhos caseiros, enquanto as crianças brincavam.

- Você sabe onde está o fulano?, perguntou a cunhada, sobre o paradeiro do irmão.
- Não exatamente, titubeou a minha amiga. Ela queria dizer: não sei absolutamente nada dele, mas ficou envergonhada da própria ignorância.
- Pois eu sei!
- Sabe?!
- Sim. O teu marido saiu daqui para morar com outra em tal cidade, em tal estado.
- Cuméquié?!?! Estupefata, ela não acreditava no que ouvia.
- Verdade! E vou dizer mais: ele anda com essa mulher desde que vocês se casaram. Não é coisa de ontem!
- Não é possível...
- É possível, sim. E outra: você é muito mais bonita do que ela. Não posso entender os homens! (Nisso, a cunhada desandou em um discurso feminista daqueles!).
- Como assim? Ela não é bonita? (A minha amiga nem ouviu o mais que a outra havia dito).
- Não, minha filha. A criatura é uma coisinha assim, sabe? Tudo meio.
- Hã?!
- Meio feinha, meio burrinha, meio grossa, meio chatinha... Resumindo: é meio roceirinha.
- Isso não! (A minha amiga revoltou-se). Não admito! Pode me trocar por outra, mas que seja melhor que eu, senão me ofende! Sabe o que é isso? Não adianta a humanidade ter evoluído: homem não quer mulher que seja igual ou mais que ele.

A minha amiga contou que deu uma choradinha básica, mas depois pensou no que fazer. Rapidinho, arrumou outro e não atende as ligações do ex. Se quiser falar com ela, terá que ser pessoalmente, cara a cara. Assim, já vão direto para os “finalmente” da separação. Por que estresse se a vida é curta e sofrer não vale a pena? Foi o que ela disse.

sábado, 20 de novembro de 2010

Na frente do espelho (*)

Vera Pinheiro

Não é a irmã, o irmão, a filha, a mãe, a pessoa a quem a gente conta quase tudo nem o namorado. Quando se trata de imagem, o espelho é o melhor amigo da mulher. E o dinheiro, claro, pois beleza custa caro. O espelho denuncia as precariedades e as virtudes do nosso visual e dependendo do grau de intimidade e da sinceridade com que estabelecemos uma relação com ele, esse objeto pode fazer milagres pela nossa autoestima. Ou não. O espelho fala mesmo! O problema é que nem sempre queremos ouvir o que ele tem a dizer e o ignoramos. Mas quando o enfrentamos com determinação e coragem, pedindo que mostre tudo o que deve ser mostrado, aprendemos muito sobre nós e a respeito de mudanças positivas também. A propósito, quantas vezes ao dia tu te olhas no espelho?

     Amiga minha, Paula Fragale-Noble, que nesta semana completou 28 anos, acorda já na frente do espelho. Tanto é que a mãe dela e minha amiga Rita Helena, em visita que fez à filha nos Estados Unidos, observando os costumes da nova vida de Paula, comentou (com os devidos cuidados de sogra em casa de genro pela vez primeira): “Filha, você dorme maquiada?!”.
     - Dããããrrrr, mah! Até parece que você não sabe que eu acordo e me maquio!

Pois assim é. O último bocejo e a espreguiçada derradeira são na frente do espelho. Quando Nicolas Noble, com quem Paula é casada há dois anos, acorda... ela já está com a estampa feita! Mas não se importa que saia um pouquinho do batom no beijo de bom dia. Tudo certo. Nem precisava tanto, porque ela é linda e tem a juventude a seu favor, vantagem que não me assiste. Com cinco décadas e lá vai caco (neste dezembro, com 5 + 5 matematicamente vou ficar nota dez), não saio ao portão para atender o carteiro, se estiver sem maquiagem. Em caso de pressa extrema – eventual fuga dos cães ou ser chamada para acudir vizinha que passa mal – cubro-me com um véu, e isso será menos assustador do que a tragicômica realidade do rosto sem chapisco, emboço e reboco, antes da caiada básica diária. Não dá! O peso e estrago do tempo são implacáveis!

Bem, admito um pouco de exagero nisso. Há, sim, dias em que saio só com um creme que proteja a minha linda pele dos efeitos danosos dos raios solares. Nesse caso, torço fervorosamente para encontrar apenas pessoas que não me conheçam e não cruzar com nenhum ex alguma coisa ou inimigo figadal. Se encontrar amiga ou antiga colega espero que ela esteja sem os óculos e não me veja, e que eu não atravesse o caminho de quem está no passado nem de quem representa uma mínima possibilidade de relacionamento futuro. Como medida preventiva contra encontros inesperados em situação de cara lavada, levo um chapéu de apara-castigo, de abas grandes e caídas, para cobrir a cabeça e metade do rosto, sem esquecer da pose de estrela que ralou muito para ficar conhecida e depois impõe a si mesma um misterioso recolhimento e anonimato.

     Se sair atrasada de casa, carrego o kit beleza, que tem de tudo um pouco. Enfio óculos escuros na cara e não tiro até que esteja confinada e a sós para fazer a maquiagem. Se por qualquer razão não puder me maquiar, prefiro usar uma burka! Produtos de beleza – cremes hidratantes, um para cada pequenina área do corpo, milimetricamente subdivido, maquiagem mais perfumes (no plural) – são produtos de primeiríssima necessidade. São a minha cesta básica, não posso ficar sem! Pago uma espécie de dízimo para a minha porção Barbie, que adora se enfeitar e viver, digamos assim, a parte cor de rosa da existência, contrabalançando com o lado rude, solitário e amargo, que também existe. Em caso de choro, compulsivo ou não, sigo o conselho de outra amiga, Adriana Carvalho: chorar na frente do espelho. É riso na certa, comprovei. Não há motivo que resista! Assim, duas coisas estão na lista do que não faço diante de espectadores: andar sem maquiagem e chorar. Fico muito feia. Fico, porque não sou!
    
     E se há um tanto de invencionice nisso, uma verdade é irretocável como a primeira hora de uma maquiagem bem feita: quando estamos felizes, a vida nos enfeita e embeleza de tal modo que sequer importa se usamos batom ou não. Vai do gosto de cada uma. Eu gosto de ser mulher com tudo o que isso representa, do universo da aparência cheia de detalhes, potinhos e pincéis a essa alma de inquietudes, sonhos, desejos, buscas e realizações. E de espelhos, sempre.


(*) Crônica publicada na edição de 20 e 21 de novembro de 2010 do jornal A Razão (www.arazao.com.br) de Santa Maria, RS.