sábado, 12 de outubro de 2019

AINDA BEM!

Vera Pinheiro
Hoje, ao contrário de muitas pessoas, resisti bravamente à tentação de postar fotinhos dos meus filhos quando eram crianças. Não tenho mais criança em casa. Aliás, não tenho mais filhos em casa. Graças dou! Eles cresceram! São donos de suas vidas e sabem onde colocam os seus narizes. Sabem cuidar de si mesmos, responsabilizam-se por suas escolhas, cumprem os seus compromissos, determinam de moto próprio onde vão colocar pés e desejos, têm consciência do que podem e do que não devem, enfrentam seus desafios, traçam os seus limites, definem o que querem e decidem o que não querem. Aprenderam a administrar a sua existência fora do ninho da mãe, embora saibam que podem contar comigo sempre que e se precisarem.
Que alívio! Meus filhos não são mais crianças! Não preciso me ocupar de orientar os seus passos e cuidar para que não caiam. Eu lhes ensinei o básico necessário para uma existência em bom caminho. E lhes dei uma lição preciosa: a gente sempre se levanta, a gente sempre recomeça, a gente sempre se refaz, não importa o que aconteça. Tudo é aprendizado. Fiz isso com a didática do exemplo, que vale por um discurso inteiro!
Ah, que alegria! Meus filhos cresceram! Eu me tornei desnecessária e não há sensação melhor do que essa certeza. O melhor de ser mãe é ter dado tudo, e tanto, até que os filhos não precisem mais receber, porque aprenderam a construir. Isso é o tal do dever cumprido. Não gostaria, sinceramente, que passados dos 30, beirando os 40, meus filhos ainda devessem satisfações à mãe do que resolveram fazer com as suas vidas. Agora o que importa é o que eu vou fazer da minha vida, porque deles cuidei o bastante para agora não ser necessária a eles para outra coisa que não seja compartilhar amor. Agora eu me sou necessária e absolutamente imprescindível. Hora de me voltar para mim!
Essa desnecessidade de cuidar dos filhos quando eles crescem é, de certa forma, um amoroso abandono da missão materna de nutrir, cuidar, manter, sustentar, sem, porém, deixar de amparar e acolher. Isso é, também, um necessário desapego que se faz por amor, porque eles já não são mais crianças e porque confiamos naquilo que lhes ensinamos.
O melhor de ser mãe é já não precisar ser mãe o tempo todo, porque a gente fez o melhor, o que julgava mais certo, o que era mais adequado, o possível dentro das nossas limitações. É olhar para trás e sentir-se em paz com o passado. É olhar o futuro e confiar que os filhos poderão fazê-lo feliz. É olhar o presente e aplaudir, com aquele orgulho que só a mães têm, as pessoas que os nossos filhos se tornaram.
Para quem tem filhos criados, o tal “trabalho dobrado” é ser capaz de vislumbrar a si mesma como uma mulher inteira, que não coloca a própria felicidade nas mãos dos filhos, que cortou o cordão umbilical sem desfazer os laços de amor, que consegue entrever as próprias possibilidades sem fazer dos filhos uma bengala para alcançar a felicidade.
O grande desafio quando os filhos deixam de ser crianças é buscar aquela pessoa que se esqueceu de si entre fraldas e papinhas. É reencontrar a mulher que se dedicou aos pequenos e se abandonou. É prosseguir sua busca pela completude sem depender dos filhos, porque eles cresceram e, pelo bem deles, não se deve fazê-los eternas crianças.

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