sábado, 13 de abril de 2013

Dor masculina (*)

Vera Pinheiro
            Amigo meu estava inconsolável com o término do namoro. Chorou copiosamente no conforto dos meus ombros e deitou queixas nos meus ouvidos até acalmar a dor que, sinto avisar, demora bastante para passar. O inusitado despertou em mim uma sincera solidariedade com o sofrimento masculino, sem deixar de me sentir, de certa forma, vingada por todas as lágrimas que derramei em circunstância assemelhada.
A conclusão óbvia: eles, como nós, sofrem em lágrimas de esguicho por suas frustrações de amor. O sinal de mudança é não esconderem mais isso, se mostrarem frágeis no relacionamento e se acabarem de chorar com o final infeliz da história. Nas curvas do passado, essas eram cenas protagonizadas pelas mulheres tão somente. Eles faziam, sim, todos os lamentos, mas confidenciavam apenas aos amigos, que mantinham o fato em segredo para não desmerecer o sujeito. Nisso os homens são admiráveis: mantêm a classe unida na dor, no amor e nas safadezas. Já nós, mulheres, estamos aprendendo o sentimento de irmandade que para muitos é inconveniente pela força que isso representa.
            Voltando ao meu sentimental e sofredor amigo, vou descrever o tipo. Pensem num homem alto, forte, com belíssimos olhos verdes, culto, simpático e de boa condição social. Ele é muito mais que isso. Nada tendo que mereça críticas na performance sexual (dizem!), é um amante do tipo que manda flores, diria Roberto Carlos, emendando “esse cara sou eu”. Romântico, faz de tudo para a mulher se sentir o máximo! Demonstra amor como poucos que conheço. E se enquadra naquele modelinho que a gente cresce querendo um que seja igual: abre a porta do carro, puxa a cadeira, dá a vez no elevador... e não esquece datas! Enfim, um bípede evoluído que não se compara a muitos trogloditas que algumas adoram, vai saber por quê! Bem educado e de boa formação, é um cavalheiro de comportamento irretocável. Um gentleman!     
            - E sozinho!, reclama ele.
            Eu tentava consolá-lo, enumerando virtudes que enxergo nele e que, certamente, não passam despercebidas, porque a gente, afinal, é boa nisso: num olhar de relance identificamos todas as qualidades e defeitos, e temos um desenho pronto do homem perfeito que queremos ao nosso lado.
          - Faço de tudo pela mulher que amo e ainda assim não consigo agradá-la. Além disso, sou sincero e sou fiel. Será que as mulheres gostam de cafajestes?
            Ainda bem que ele não usou o detestável “vocês”, que eu rejeitaria. Até em estado de padecimento amoroso ele é gentil. Atenção, desconfiadas de plantão: não tenho qualquer motivo, mínimo que seja, para não acreditar no que ele diz, o que me autoriza a confiar no relato que faz de si mesmo.
            Por que uma mulher dispensa um homem como esse, que a todos encanta e que muitas, tenho certeza, se rasgam e esbofeteiam as outras para estar ao lado dele? Será que ainda funciona conosco o que nossas mães e avós diziam, que a dificuldade atiça a vontade? Isso lá nos tempos em que se dava “prova de amor”, totalmente dispensável hoje, pois esse sentimento vai muito daquilo que preocupava as gerações passadas em termos de relacionamentos.
            O que, afinal, nós queremos dos homens? Que eles nos conquistem ou que nós possamos conquistá-los para depois exibi-los como condecoração enquanto desfilamos de salto e homem a tiracolo? Não queremos ser paparicadas por medo da opressão que possa vir embutida? Queremos inverter o processo de dominação que tanto fizemos para derrubar? Preferimos aqueles que dão assunto com as amigas, os de quem temos motivos para reclamar, pois os muito perfeitinhos nos cansam facilmente? Essa postura tem muito do que era discurso masculino.
“Homem bom não dá em touceira”, dizia a mamita, que se casou uma única vez na vida e, viúva, ficou sozinha. Muitas mulheres reclamam da qualidade dos homens, mas rejeitam o tipo bonzinho que aparece em sua frente, isso é fato. Não me demorei procurando respostas, que são individuais, para dar a ele. Eu me debrucei nos ombros do meu amigo e suspirei: “Eu também”. E assim a vida segue, entre solidões compartilhadas e o passar do tempo com aprendizados e lições. Uma delas, antes que me perguntem: a maneira mais eficiente de afastar um possível enamorado é transformá-lo em amigo que chora junto. Era melhor no tempo em que a gente chorava apenas com as amigas...
(*) Crônica publicada na edição de 13/14 de abril de 2013 do jornal A Razão, de Santa Maria/RS (www.arazao.com.br)

Um comentário:

  1. É com um imenso prazer que faço sim parte do seu blog....Recordo-me como se fosse hoje quando criei meu blog....todos os dias ficava acinoso q espera de um rosto no meu espaço....Hoje vim fazer parte do seu lindo espaço em expançao....Quero sim ver-te em www.uanderesuascronicas.blogspot.com

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