terça-feira, 30 de novembro de 2010

Colheita farta

Vera Pinheiro
Lá em casa tudo dá, uma maravilha! Os coqueiros deram cocos, as mangueiras darão muitas mangas, a romãzeira está dando romãs e a caramboleira dá carambolas o ano todo. Quantas bênçãos da natureza para o meu recanto!


No fim de semana eu e Camila subimos na romãzeira para colher os frutos maduros e eu fui premiada com uma romã na testa! Tóim! Doeu, claro. Mas o sabor da fruta vermelhinha, vermelhinha, era delicioso. Compensou o esforço, mas o fato é que eu preciso – urgentemente – me equipar para a colheita para não precisar trepar nas árvores. Ainda bem que são baixinhas e posso pegar os frutos com a mão. 

Pensa numa romã do tamanho da mão caindo na minha testa...

 


 A colheita será farta lá em casa neste final de ano. Os cachorrinhos já estão se fartando das mangas maduras. Tudo é tão bom, tudo é tão belo na natureza! Eu me desvaneço, cheia de gratidão.
É o cão chupando manga!
   

Meu coqueiro já dá cocos!



segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Gafe!

Vera Pinheiro
Gafe é um acidente de percurso quando a gente sabe como proceder, mas a mancada é inevitável, simplesmente escapa. É um incidente que seria possível evitar, não fosse uma distração qualquer e... putz, já era. O que fazer? Nada a fazer. Se não der pra sair correndo rua afora, permanece, congela e encara a situação com a maior cara de “sinto muito, foi mal”. É melhor não tentar explicar a gafe, pois geralmente a agrava. Deixa quieto e espera que se esqueçam do acontecido.

          Hoje eu almoçava num restaurante self service. No início eu estava só, mas depois se sentaram um homem e duas mulheres. Conversavam animadamente à mesa e eu, quietinha na cabeceira, afinal, a conversa não era comigo.

          Lá pelas tantas, o coitado do homem está cortando a carne quando um pedaço voa fora do prato. Já aconteceu isso contigo também? Pois é. O pedaço quase parou no meu prato, tirou um fininho, mas passou rápido demais e... escanteio para o naco da bisteca do cara! Ele nem viu onde ela foi parar: coladinha nos meus pés. Mas eu não ia juntar do chão e perguntar: “É seu?”. Fiz que não vi e continuei comendo como se nada tivesse acontecido. Segurei o pranto de piedade pelo homem... e o riso. Pensei em contas a pagar, porque não tem coisa que me faça ficar mais séria do que isso. Broxadas que testemunhei me fazem rir, então nem penso nisso, senão ninguém me segura. Passo mal.

Espiei com o rabo do olho e vi o vermelhão intenso da cara dele. Tadinho. Ele se ocupava em recolher o arroz que fugiu do prato para a mesa, tudo esparramado sobre a toalha. Por que não chamou o garçom? A pior coisa é tentar consertar com as próprias mãos. Aquilo também!

Logo saí dali e fui para a fila pagar o meu almoço. Na fila ao lado, pessoas se serviam de café. Dali a pouco, uma mulher de uns 40 e poucos me olha e começa a fazer uma cara estranhíssima! Parecia querer dizer: “Fiz merda” ou “Fodeu geral”. Longe de mim pensar que a culpa fosse minha ou que aquela cara de quem vai começar a chorar tivesse a ver comigo. O problema é que ela olhava de um jeito muito estranho mesmo. Eu não sabia se falava com ela para perguntar se ela estava passando mal e precisava de ajuda ou se me calava, ou, talvez, ela houvesse soltado um pum na fila e queria disfarçar. Ah, vai saber os problemas por que passa um ser humano!

Parecia estar engasgada e eu já estava para cair de tapas nas costas dela quando um garçom passou no meio das duas filas e ela, finalmente, se atreveu a falar. “Moço, fiz uma coisa...”. Será xixi nas calças? Só pensei, claro, e continuei quieta, observando a cena. Ai, meus sais, por que as pessoas não vão direto ao assunto? Será que precisam mesmo das preliminares?

“Tudo bem, senhora. Eu dou um jeito nisso”. O garçom foi o máximo! Nem esperou que ela mostrasse o que fez, já entendeu tudo. Vai ver não era a primeira que desmontava a máquina de fazer café a jato...ou sei lá como se chama aquela cafeteira. Eu ainda prefiro que me sirvam café na mesa.

Não ouvi a mulher agradecer, mas espero que o tenha feito. Ei, volta aqui e te desculpa por teres me olhado com aquela cara de “socorro!”. Não gosto de levar sustos, porra! Nem posso!






O café derramado.


Como será que ela fez isso?!


O garçom deu um jeito e eu tirei uma foto!

domingo, 28 de novembro de 2010

A sós

Vera Pinheiro
Todo mundo devia ficar a sós (um pouco, ao menos) para cultivar a própria companhia e saber como anda a relação íntima consigo mesmo. Ficar, estar ou ser só amplia o autoconhecimento, obriga a descobrir quem a gente é – ou o quê – e a se confrontar com a identidade do ser.

Eu preciso de alguma solidão, às vezes. Ela me faz bem. E diria que ela me é necessária.

Quando dou folga de mim às pessoas, ou se elas me dão folga, eu me recolho e me contemplo. Vendo-as de longe, geralmente mais desejo manter a proximidade. Ou não, em alguns casos. O afastamento e a solidão mostram quem e o quê realmente importa, quem e o quê nós queremos. 

Um dos problemas do convívio é não haver saudade. A saudade desvenda os mistérios do desejo. Se não sentimos saudade não temos razões para ficar perto.

Preciso ficar só para entender isso, às vezes. Mas a saudade que me consome, também às vezes, não tem o poder de trazer de volta quem partiu ou quem não quer voltar. E a vida segue, entre ausências, despedidas e solidão contemplativa.

Não é tão ruim ficar, estar ou ser só. Eu até gosto...

sábado, 27 de novembro de 2010

Os instrutores (*)

Vera Pinheiro
            Vive a tua vida de modo que não precises franzir o cenho por contrariedades. Que não te falte a serenidade que amaina a forma de encarar os acontecimentos e permite resolver os problemas sem aflições. Que o teu olhar seja manso, suave e iluminado de contentamento. Que não se inquiete o teu espírito perante as dificuldades e que elas sejam reais oportunidades de aprendizado. Que as tuas palavras sejam temperadas de doçura e que a tua voz não se eleve além do tom de uma carícia, mas sê firme no que dizes, e seguro do que expressas até mesmo com o silêncio.

            Não permitas que outras pessoas comandem as tuas vontades. Só tu podes – e deves – ser dono de ti mesmo, do que queres para o teu destino e o único responsável pela maneira como escolheste viver. Exerce pleno domínio sobre as tuas atitudes e te sentirás fortalecido. Procura conhecer-te ao máximo para que as tuas reações não sejam imprevisíveis ao teu conhecimento e para que possas esquivar-te das ciladas e dos perigos que tu mesmo podes, inadvertidamente, armar.

Não te deixes embalar pela vaidade, que cobre de ilusões o teu auto-retrato e o faz muito diferente do que, na realidade, és. Cuida da tua essência para que ela se mantenha íntegra e não se esfacele com apelos que são o vazio disfarçado de alegria. Não esperes lucros fáceis nem vantagens que não venham com o trabalho de cada dia e a dedicação somada a esforço. Desconfia de garantias de sucesso sem custo e observa se o pagamento, em troca, não será a entrega da tua alma, começando pela perda de valores. Não te deixes corromper e vigia o teu comportamento para que ninguém faça a vigilância que te cabe. Nada faças sem a aprovação da tua consciência, e que ela seja transluzente.

Ousa na medida da confiança que tiveres do que podes fazer na circunstância que exige que sigas em frente ainda que não conheças bem o caminho. Avalia as possibilidades, mede os riscos e toma os cuidados necessários para que todos os resultados sejam benéficos, ainda que eles contrariem as tuas expectativas.

Evita os derrotistas e os invejosos, e não gastes teus argumentos para convencê-los de que devem agir em sentido contrário. Não há o que fazer por quem não quer fazer por si e o crescimento individual se dá no ritmo de cada um. Não te desgastes em aborrecimentos pelo que fazem contra ti, entrega tudo à perfeita ordem do universo e ela se encarregará de responder aos teus algozes. Jamais queiras o que pertença a outrem. Busca por teus méritos o que desejas sem prejudicar quem quer que seja, para que não geres um débito futuro com a vida, e ela te cobrará inapelavelmente todo o mal que praticares assim como te recompensará generosamente por todo o bem que tu fizeres.

Não te revoltes com pessoa que, a um olhar distraído e de pouca sabedoria, pareça estar no mundo para te causar desagrado e por quem nutres antipatia que não é gratuita por ser, aquela criatura, muito hábil em tirar a tua paciência. O que nos causa repugnância é um instrumento para a nossa evolução e aquele a quem rejeitamos, com ou sem razão, atua como instrutor do nosso processo evolutivo, verdadeiro mestre que nos ensina virtudes cada vez mais raras como a compreensão e o perdão. Mantém distância sem terceirizar o poder sobre as tuas decisões e sobre o teu humor. Não te empenhes tanto em fazer amigos e, sim, em não colecionar inimigos, pois a ajuda que podes receber por meio de uma amizade não é tão grande como o mal que impulsiona as ações de quem te odeia. Porém, apesar de tudo, não retribuas ódio com sentimento de igual natureza. Eleva-te acima das provocações e das ofensas e não sintonizes com energias densas, que diferem da tua, que a paz habita e a brandura é a maior aliada.

Age em vez de preocupar-te e sorri mais vezes e para quem cruzar contigo. Poucos adentrarão no convívio com o teu ser mais profundo e, assim, nem todos te conhecerão. Então, pode acontecer de que chores sozinho e venças sem auxílio, mas não te amargures pela solidão nem te sintas como um abandonado pela humanidade. A fé preenche o coração e nos põe em contato com forças que nos amparam nos momentos mais difíceis, tenhamos gente por perto ou não. E se tuas feridas emocionais sangrarem, o bálsamo ao alcance da mão é o amor, que se fundamenta na bondade. Ocupa-te, portanto, em ser bom e serás o refúgio em que o amor repousa e vibra, se recompõe e se resguarda para depois se espargir por onde andares.


(*) Crônica publicada na edição de 27 e 28 de novembro de 2010 do jornal A Razão (www.arazao.com.br) de Santa Maria, RS.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Coisinhas inúteis

Vera Pinheiro
 Por que os restaurantes dos shoppings insistem em colocar junto dos pratos um pacotinho de sal e um palito? Coisinhas mais inúteis! Adicionar sal à comida é envenenar as refeições e esgaravatar os dentes com palito é um horror inominável. Será que ninguém da área da alimentação se toca que quem quiser sal deve pedir (ou carregar) e que palitos devem ser banidos da mesa?
 Há tantas coisinhas inúteis, que a gente não precisa e devia descartar. Zangas prolongadas e desnecessárias, raiva pelo que não tem solução, angústia por aquilo que não depende de nós, ansiedade pelo que ainda não aconteceu, temores amplos e gerais pelo que não sabe e não tem como saber.

Nessas horas é valioso fazer uma avaliação do que é inútil e do que é necessário viver, e manter o autocontrole para não perder a capacidade de discernir os fatos. Serenar e depois fazer o que se faz com o pacotinho de sal e o palito: deixar de lado. São coisinhas inúteis.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Tensão e chocolate

Vera Pinheiro
Hoje estou com a vó amarrada no toco! Tensa! Hipertensa! Nem eu me agüento! Preciso de um sossega-leão urgente. Não, não estou falando de sexo, mas de uma boa sessão de acupuntura! Ando sem tempo para isso, que é algo que adoro e de que preciso, embora saiba que preciso me dar prioridade.

Hoje, ao meio dia, comi um pratão de salada e um pedaço de carne. Sim, estou de regime. Não, é melhor dizer reeducação alimentar. Aprendi a comer quase tudo sem sal e com isso a reconhecer o verdadeiro sabor dos alimentos. Essa é a parte boa da restrição. Só não quero comer jiló e moranga. Nunca provei jiló e comi moranga demais quando era criança.

Naqueles idos, na casa de minha mãe criança não tinha direito de dizer “não gosto”. Era fazer cara feia para uma comida e a mamita lascava: “Vai comer o que quiser quando tiveres a tua casa”. Foi exatamente isso o que fiz. Nunca cozinhei moranga e quibebe. A minha bronca com jiló não tem nada a ver com a infância, é só antipatia mesmo. Jamais servi miúdos de galinha – ninguém me convence de que coraçãozinho tem bom sabor. Criei meus filhos sem bife de fígado – e eles cresceram bem fortinhos, apesar disso.

Vejo muita criança empurrar o prato e dizer “não quero, não gosto”. Os pais deviam ensinar os filhos a dar graças pelo prato de comida que têm sobre a mesa, lembrando-os das muitas crianças que passam fome.

Minha mãe era durona, mas sou-lhe muito grata por suas lições. E gratidão também é algo que se ensina em casa. Quem não aprendeu gratidão não dá valor para nada.

Como estava dizendo, hoje eu comi um pratão de salada mista (de tudo um pouco), mas me permiti um, está bem, dois bombons. Curou-se rapidinho o meu humor lascado de hoje. Será que sou chocólatra?! Claro que não! Passo muito tempo sem comer chocolate. Aliás, nem gosto de doce, só de pudim de leite condensado. Reeducação alimentar não significa privação de uma das melhores coisas da vida – comer, mas ter hábitos saudáveis que, muito lá de vez em quando, podem ser quebrados por um chocolatinho inocente.

Estou calminha agora...

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Ele foi embora

Vera Pinheiro

Amiga minha está casada há alguns anos e tem um filho de sete. Outro dia, o marido comunicou-lhe que a empresa onde trabalha decidiu transferi-lo para outro estado e que, no começo, até conhecer melhor a cidade, ele iria sozinho. Depois, no período mais apropriado para mudanças escolares, viria busca-la com o menino. Ele foi embora, ela ficou.

Logo começou a estranhar a ausência dele, mas, boa de coração uma barbaridade, creditou o fato à nova etapa, o emprego novo, morando de qualquer jeito, sem ela para ajudá-lo, coitado. Estava acostumada a relevar tudo desse homem por quem era apaixonada.

Os primeiros 15 dias. Ela se revirando na cama, sozinha, a espera dele. Um mês. Bom, vou dar um jeito na vida, arrumar as coisas para mudar em breve. Dois meses, um telefonema. “Oi, amor, vou falar rápido. Estou muito cheio de serviço. Tudo bem com vocês? Mandei dinheiro”. Ah, que lindo, ele todo generoso. Três meses. Por que ele não comprou ainda um celular e por que não dá o endereço para eu visitá-lo?, pensou. Está correndo demais, tadinho. Quatro meses. Eu nem sei onde ele trabalha... Vai ver não quer me preocupar. Ela é boazinha demais mesmo.

Cinco meses depois, ele ainda não apareceu em casa, não deu endereço da empresa nem da moradia e diz não ter celular. Pacientemente, ela espera. Como sempre, aliás.

Um dia, encontrou-se com a cunhada num shopping. “Aparece lá casa pra gente conversar”, convidou a outra. No sábado, ela foi. Tomaram chá com biscoitinhos caseiros, enquanto as crianças brincavam.

- Você sabe onde está o fulano?, perguntou a cunhada, sobre o paradeiro do irmão.
- Não exatamente, titubeou a minha amiga. Ela queria dizer: não sei absolutamente nada dele, mas ficou envergonhada da própria ignorância.
- Pois eu sei!
- Sabe?!
- Sim. O teu marido saiu daqui para morar com outra em tal cidade, em tal estado.
- Cuméquié?!?! Estupefata, ela não acreditava no que ouvia.
- Verdade! E vou dizer mais: ele anda com essa mulher desde que vocês se casaram. Não é coisa de ontem!
- Não é possível...
- É possível, sim. E outra: você é muito mais bonita do que ela. Não posso entender os homens! (Nisso, a cunhada desandou em um discurso feminista daqueles!).
- Como assim? Ela não é bonita? (A minha amiga nem ouviu o mais que a outra havia dito).
- Não, minha filha. A criatura é uma coisinha assim, sabe? Tudo meio.
- Hã?!
- Meio feinha, meio burrinha, meio grossa, meio chatinha... Resumindo: é meio roceirinha.
- Isso não! (A minha amiga revoltou-se). Não admito! Pode me trocar por outra, mas que seja melhor que eu, senão me ofende! Sabe o que é isso? Não adianta a humanidade ter evoluído: homem não quer mulher que seja igual ou mais que ele.

A minha amiga contou que deu uma choradinha básica, mas depois pensou no que fazer. Rapidinho, arrumou outro e não atende as ligações do ex. Se quiser falar com ela, terá que ser pessoalmente, cara a cara. Assim, já vão direto para os “finalmente” da separação. Por que estresse se a vida é curta e sofrer não vale a pena? Foi o que ela disse.

sábado, 20 de novembro de 2010

Na frente do espelho (*)

Vera Pinheiro

Não é a irmã, o irmão, a filha, a mãe, a pessoa a quem a gente conta quase tudo nem o namorado. Quando se trata de imagem, o espelho é o melhor amigo da mulher. E o dinheiro, claro, pois beleza custa caro. O espelho denuncia as precariedades e as virtudes do nosso visual e dependendo do grau de intimidade e da sinceridade com que estabelecemos uma relação com ele, esse objeto pode fazer milagres pela nossa autoestima. Ou não. O espelho fala mesmo! O problema é que nem sempre queremos ouvir o que ele tem a dizer e o ignoramos. Mas quando o enfrentamos com determinação e coragem, pedindo que mostre tudo o que deve ser mostrado, aprendemos muito sobre nós e a respeito de mudanças positivas também. A propósito, quantas vezes ao dia tu te olhas no espelho?

     Amiga minha, Paula Fragale-Noble, que nesta semana completou 28 anos, acorda já na frente do espelho. Tanto é que a mãe dela e minha amiga Rita Helena, em visita que fez à filha nos Estados Unidos, observando os costumes da nova vida de Paula, comentou (com os devidos cuidados de sogra em casa de genro pela vez primeira): “Filha, você dorme maquiada?!”.
     - Dããããrrrr, mah! Até parece que você não sabe que eu acordo e me maquio!

Pois assim é. O último bocejo e a espreguiçada derradeira são na frente do espelho. Quando Nicolas Noble, com quem Paula é casada há dois anos, acorda... ela já está com a estampa feita! Mas não se importa que saia um pouquinho do batom no beijo de bom dia. Tudo certo. Nem precisava tanto, porque ela é linda e tem a juventude a seu favor, vantagem que não me assiste. Com cinco décadas e lá vai caco (neste dezembro, com 5 + 5 matematicamente vou ficar nota dez), não saio ao portão para atender o carteiro, se estiver sem maquiagem. Em caso de pressa extrema – eventual fuga dos cães ou ser chamada para acudir vizinha que passa mal – cubro-me com um véu, e isso será menos assustador do que a tragicômica realidade do rosto sem chapisco, emboço e reboco, antes da caiada básica diária. Não dá! O peso e estrago do tempo são implacáveis!

Bem, admito um pouco de exagero nisso. Há, sim, dias em que saio só com um creme que proteja a minha linda pele dos efeitos danosos dos raios solares. Nesse caso, torço fervorosamente para encontrar apenas pessoas que não me conheçam e não cruzar com nenhum ex alguma coisa ou inimigo figadal. Se encontrar amiga ou antiga colega espero que ela esteja sem os óculos e não me veja, e que eu não atravesse o caminho de quem está no passado nem de quem representa uma mínima possibilidade de relacionamento futuro. Como medida preventiva contra encontros inesperados em situação de cara lavada, levo um chapéu de apara-castigo, de abas grandes e caídas, para cobrir a cabeça e metade do rosto, sem esquecer da pose de estrela que ralou muito para ficar conhecida e depois impõe a si mesma um misterioso recolhimento e anonimato.

     Se sair atrasada de casa, carrego o kit beleza, que tem de tudo um pouco. Enfio óculos escuros na cara e não tiro até que esteja confinada e a sós para fazer a maquiagem. Se por qualquer razão não puder me maquiar, prefiro usar uma burka! Produtos de beleza – cremes hidratantes, um para cada pequenina área do corpo, milimetricamente subdivido, maquiagem mais perfumes (no plural) – são produtos de primeiríssima necessidade. São a minha cesta básica, não posso ficar sem! Pago uma espécie de dízimo para a minha porção Barbie, que adora se enfeitar e viver, digamos assim, a parte cor de rosa da existência, contrabalançando com o lado rude, solitário e amargo, que também existe. Em caso de choro, compulsivo ou não, sigo o conselho de outra amiga, Adriana Carvalho: chorar na frente do espelho. É riso na certa, comprovei. Não há motivo que resista! Assim, duas coisas estão na lista do que não faço diante de espectadores: andar sem maquiagem e chorar. Fico muito feia. Fico, porque não sou!
    
     E se há um tanto de invencionice nisso, uma verdade é irretocável como a primeira hora de uma maquiagem bem feita: quando estamos felizes, a vida nos enfeita e embeleza de tal modo que sequer importa se usamos batom ou não. Vai do gosto de cada uma. Eu gosto de ser mulher com tudo o que isso representa, do universo da aparência cheia de detalhes, potinhos e pincéis a essa alma de inquietudes, sonhos, desejos, buscas e realizações. E de espelhos, sempre.


(*) Crônica publicada na edição de 20 e 21 de novembro de 2010 do jornal A Razão (www.arazao.com.br) de Santa Maria, RS.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Silêncio

Vera Pinheiro

Quanto mais o tempo passa mais me convenço da necessidade e da importância de cultivar o silêncio. Tantas palavras que a gente diz e ouve e que não devia ter dito e não merecia ter ouvido, tantas mentiras que negaram a verdade e tantos silêncios que a confessaram.

Não dá para crer em tudo o que nos dizem, assim como devemos pensar muito antes de falar, recuando de palavras que enganem ou firam.

Mais a gente se arrepende das palavras que brotam dos ímpetos do que do silêncio que se guarda no sossego do espírito.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Feriado espichado... e bom!

Vera Pinheiro

Ai, ai... Estava tão bom que espichei o feriado em mais um dia! E tão bom estava que prefiro guardar comigo a lembrança desse tempo. Não vou compartilhar, sinto muito por quem é curioso. Alguns momentos e vivências a gente precisa reservar na mais profunda intimidade, naquele compartimento individual e intransferível a que ninguém tem acesso. Não porque não mereça, mas porque é tão intensamente nosso que não dá para dividir. E se dividisse talvez ninguém compreendesse. Ou não, mas prefiro não arriscar, neste caso especialíssimo.

Enfim, de volta à rotina, e a vida reclama assumir meus compromissos com tudo o que está à minha espera para ser feito. Sei, no entanto, que, antes de tudo e de todos, quem precisa de mim sou eu, e me devo uma felicidade inteira, como bem mereço.

E tudo segue em perfeita e divina ordem, como é e como deve ser. Nada é eterno, mas me faz feliz enquanto dura. Porque tudo passa, não deixo que passe sem que eu viva a intensidade do que é possível viver.

sábado, 13 de novembro de 2010

Poder voltar (*)

Vera Pinheiro

          Certa vez, despachando com o Vice-Presidente da República José Alencar, ele me deu uma grande lição de vida, das tantas que deu a todos, durante a sua enfermidade: “O importante na vida é poder voltar”, frase que lhe disse o pai em 1946, quando deixava a casa paterna para trabalhar em Muriaé como balconista em uma loja de tecidos. 

          “Quando saí de casa, aos 14 anos, pedindo “bênção, mamãe”, “bênção, papai”, ele falou comigo: “Meu filho, não se esqueça: o importante na vida é poder voltar! Voltar a uma pessoa, a uma família, a uma casa, a uma cidade, a um emprego, a um cargo, a uma instituição, a uma entidade, a uma situação... Voltar! Poder voltar significa viver altivo, de cabeça erguida”, explicou José Alencar, e eu ouvia comovida, rememorando convívios e experiências do passado. Seu Antonio estava coberto de razão e o filho cumpriu à risca, desde o momento em que estava de saída para o mundo com pouco mais de nada na mala, mas municiado de vontade férrea e de crença em si mesmo.

          Voltar a um lugar em que moramos um dia é marcar encontro com histórias inesquecíveis, que fazem parte de nossa trajetória. Retornar, ainda que por pouco tempo, é reverenciar os aprendizados e homenagear a vida que nos permitiu ultrapassar fronteiras e ampliar horizontes. Que bom poder voltar e replantar raízes das quais jamais nos afastamos. Por não ter qualquer razão para afastamento definitivo, reencontrar portas e corações abertos faz querer voltar, mesmo que seja para partir novamente e reconstruir a saudade.

          Voltar a uma cidade onde estivemos como visitantes nos permite lembrar a circunstância anterior que nos levou até lá. Feliz de quem tem boas lembranças, que façam brotar suspiros no peito e lágrimas de emoção nos olhos ao repetir o passeio, mesmo que tudo seja diferente de outrora, e é. Afinal, o tempo passa e a nossa paisagem interior se modifica, assim como o jeito de olhar os instantes e de vivenciá-los. Ainda bem que mudamos, porque estagnação não se coaduna com o dinamismo da existência.

          Voltar a um emprego mostra que a ruptura dos laços profissionais não carregou prejuízos ao relacionamento no plano pessoal, que estabelece o primeiro contato para traçar objetivos em comum. Que bom saber que não há perspectiva de desemprego porque, desfeito o vínculo laboral, a oportunidade está sempre aberta, ainda que outro nos substitua na vaga que ocupávamos.

          E quem não gostaria de rever, emocionado, a casa onde nasceu, a primeira escola, algum trecho da infância ou algo que acenasse para a adolescência já distante? No entanto, nem todos os prédios são preservados, eles dão espaço para a modernidade e seus lucrativos condomínios verticais. É enorme o contentamento dos que tiveram o privilégio de poder voltar ao chão onde o umbigo foi enterrado, bem como o dos que viram o quadro negro onde escreveu o primeiro bê-á-bá. E encontrar uma antiga professora produz uma emoção tão profunda e incontida que não é possível narrar, senão pela voz embargada que dá vez ao silêncio.

          Reencontrar pessoas que fazem parte de nossa vida, mas não do nosso cotidiano, é festejar a alma em sorrisos de prazer. Para isso, é fundamental não haver mágoas que desabonem a conduta de quem reaparece de surpresa. Se as recordações são boas, bastam umas poucas palavras para que a velha intimidade se restabeleça, e dali em diante nova etapa começa. Por isso a alegria de rever o primeiro amor, independente de qual seja a última anotação do estado civil feita em cartório. A sensação é a de que ter vivido aquela época valeu qualquer pena, como os desencontros e as despedidas que hoje a gente nem sabe por que aconteceram. Em vez de cobranças, um olhar maduro sobre os acontecimentos, que não são maiores do que os sentimentos.

          Entre risos, beijos e abraços, a gente nem percebe que envelheceu nesses anos de ausência. Não importam as rugas e um ou outro probleminha de saúde que modificam o visual e o comportamento, se comparados com a juventude. São, sim, outros tempos. Mas e daí? O que importa é poder voltar àquela pessoa, que jamais saiu de onde estava: dentro do coração, adormecida num cantinho privilegiado, a espera da segunda e derradeira chance.

(*) Crônica publicada na edição de 13 e 14 de novembro de 2010 do jornal A Razão (www.arazao.com.br) de Santa Maria, RS.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Mendicância amorosa

Faz parte da minha rotina diária trocar a água dos cães e gatos e alimentá-los. Logo cedo faço isso e, invariavelmente, os cachorros ficam à espera de que eu derrame no chão algumas migalhas da ração dos felinos. Pelo desespero com que abocanham uma ou outra migalha que escapa da minha mão, até parece que eles não têm sua própria ração, a canina, que lhes sirvo em boa quantia. Hoje aconteceu de novo.

A situação no mundo dos meus animais me fez lembrar dos humanos apaixonados que, não sendo correspondidos em seus sentimentos, se dedicam à mendicância amorosa e suplicam migalhas de amor. Tantas vezes eles são amados por outras pessoas, mas não se importam com elas, querem aquela pessoa que os despreza. Homens e mulheres insistem nisso e mantêm, à custa de muita humilhação e falta de autoestima, um vínculo de mão única, porque ama sozinho, quer quem não o quer e, o que é devastador, se satisfaz com o pouco que recebe, como se mais não merecesse.

Amor é para dar e receber. Quem ama sozinho não consegue amar por dois, mas se infelicitar, sim. Não é fácil, mas é necessário sair fora dessa relação que não conhece troca. É menos doloroso ficar sozinho, e na boa companhia de si mesmo, do que se deixar sugar por um sentimento que não é compartido.

Quem se submete a isso age como os meus cãezinhos. O prato deles está cheio de ração, mas eles querem o que não pode ser deles. Uma migalha, ao menos.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Reencontro

Vera Pinheiro 
           
            Estou em estado de graça, rindo à toa! Bem, nem tão à toa assim, porque tenho uma excelente razão. E mesmo que eu quisesse escrever sobre outro assunto, esse não sai da minha cabeça de cachinhos louros!
            Tive um feliz e belíssimo reencontro com alguém que faz parte da minha história, mas mora no passado. Já o havia reencontrado há alguns anos, mas estávamos em momentos pessoais diferentes e nada aconteceu. Nada além do reencontro, quero dizer. Poderia ter sido melhor, na época, mas foi bom, de todo modo. E agora, mesmo sem saber se pode ser, só a alegria que senti já é motivo para bendizer a vida, que proporciona essas visitas do inesperado.

            Estive pensando o tempo todo, de ontem para cá, em como tudo aconteceu, anos atrás. Não fiz outra coisa senão agradecer por tudo o que vivi, aprendi e conheci com ou sem ele. Creio firmemente não ser em vão cruzarmos e compartirmos vivências com alguém. E percebo, entre relembranças e saudade, que as distâncias se desvanecem diante dos melhores sentimentos.

            O tempo e o amadurecimento mostram que tudo passa. Então, aprendemos a relevar, a perdoar, a esquecer e a amar de um jeito melhor, antes que todo o resto passe e que fiquemos definitivamente a sós conosco, dormindo abraçados a recordações, sem construir o futuro,que começa agora. E a hora de ser feliz é já! Porque isso também passa.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Um rosto à arte

Vera Pinheiro

O (meu) chefe da Assessoria de Comunicação Social da Vice-Presidência da República Amaury Teixeira Machado foi quem me apresentou as belíssimas crônicas de Tião Martins, mineiro da melhor cepa, que escreve diariamente no jornal Hoje em Dia, de Belo Horizonte.


Tião é bom de escrita uma barbaridade! Cada crônica sua é melhor que outra, melhor que outra, melhor que outra. Os assuntos são variados e a fala dele baila ora com o humor ora com o romantismo, sempre com extrema sensibilidade e máxima correção e intimidade com a língua pátria. Já gostava dele, e agora gosto muito mais por tê-lo conhecido e, assim, dado um rosto à sua arte, que tanto aprecio. Ele veio de Belo Horizonte para visitar o amigo Amaury e nos encontramos.

É um cronista sensível, que admiro, e colega de jornalismo com um respeitável currículo, de foca, como todos começam, a diretor de Redação, que nem todos alcançam. O Dr. Amaury denunciou que eles foram colegas na Última Hora, e lá se vão 47 anos, segundo seus cálculos. Esses dois maravilhosos senhores estão na ativa, felizmente, e o convívio com eles é um privilégio pelas aulas de jornalismo que dão todos os dias. Podem me dar um autógrafo, por favor?



Churrasco,
feijão tropeiro
e frango com quiabo



Eu, feliz da vida com o abraço de Tião Martins, ladeado (como dizem as colunas sociais) por Amaury Machado.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Minha vida virtual

Vera Pinheiro

Sabes quando a casa está uma bagunça, os armários revirados a ponto de a gente abrir uma fresta da porta e desabar tudo o que tem dentro? Assim está a minha vida virtual! Tudo por falta de tempo, acredita!

Acho que posso me explicar. Por muito tempo vivi mais a vida virtual do que a real. Passeava mais dentro do computador do que fora de casa. Encontrava pessoas por e-mail e bem menos de pertinho. Mudei isso e comecei a me divertir muito! Só para dar um exemplo: fui ao cinema duas vezes na semana, saí com amigas, etecétera e tal, que ninguém precisa saber dos detalhes... nem há interesse, claro.

Com isso, minha caixa de e-mails está lotaaada desde quando não sei! Não recebe mais nada! Preciso dar um jeito nela em qualquer hora vaga dessas. Meu novo blog, que devia começar no domingo, ficou para hoje. Estive ocupada durante todo o dia, não pude. E assim a semana já está quase no meio e ainda não postei, o que faço agora.

Mas queres saber? No máximo posso dizer “sinto muito”. Aqui é muuuuito bom, mas fora do computador há vida inteligente também! Oba! E nada substitui um abraço de verdade, um beijo bom, uma conversa com olhos nos olhos. Beijos e abraços virtuais precisam de imaginação. Estou querendo proximidade!

Aos poucos, porém, vou retomar os assuntos da blogosfera. Sem pressa, porque se há coisa que aprendi nos últimos meses foi a não correr. Andar a passos, apreciando a vida. Porque ela, a vida, como tudo, passa!

sábado, 6 de novembro de 2010

Olhar sem ver (*)

Vera Pinheiro

            Minha filha Camila e eu almoçávamos na Praça de Alimentação de um shopping de Brasília e já tínhamos acabado a refeição quando uma moça uniformizada se aproximou e pediu licença para retirar os pratos. Disse-lhe que sim e agradeci, e antes que recolhesse o que havia sobre a mesa, Camila exclamou: “Que bonita a tua maquiagem!”. A moça se surpreendeu, mas logo sorriu de toda a boca, agradeceu e se retirou com a pilha. “Que bonito o teu gesto, filha!”, elogiei, segura da sinceridade dela e de que o agrado fora bem recebido. “E quem repara nessas pessoas que estão trabalhando aqui, mãe? Para a maioria, elas são invisíveis”. “A menos que cometam algum erro”, emendei.

            Realmente é assim que acontece. As pessoas cruzam umas com as outras e não se veem, não reparam em quem está ao lado ou à frente, quem atende em uma loja, serve um café ou bota uma bebida no balcão de um bar. Falam com quem presta um serviço como se estivessem diante de um caixa eletrônico, com a diferença de que para uma operação bancária a máquina precisa de senha, o que corresponde a um cumprimento humano. Dizer “Bom dia”, “Boa tarde”, Boa noite” não rasga a garganta de ninguém e é sinal de bons modos, que não se deve ser prerrogativa apenas dos superiores hierárquicos, mas de todos, independente da condição e posição social.

            Há quem seja educado apenas em determinadas circunstâncias e com aqueles em quem quer causar boa impressão. No mais é de uma impolidez vergonhosa! Garçons são as vítimas favoritas de quem mostra grosseria como cartão de visita. Cenas grotescas acabam com as potencialidades de um encontro agradável e fazem morrer os assuntos ali mesmo. Afinal, não dá para conversar com quem usa as regras da boa educação de modo seletivo, não como atitude incorporada ao trato com os outros.

            É bem verdade que, às vezes, temos razão para nos sentirmos insatisfeitos com o atendimento, mas isso não justifica qualquer indelicadeza. O pedido veio errado? O produto está com problema? Não gostaste de alguma coisa? Explica direitinho e pede uma solução. Não é preciso dar escândalo, xingar, aparecer, em suma, em cima de uma situação causada por alguém, o que pode não ter sido intencional, absolutamente. Por que a bobagem de tentar mostrar um poder que não existe? Não te iludas! Não te verão, por fazeres isso, como um “poderoso”, mas como um estúpido, e essa imagem cola mais do que chiclete mascado nos cabelos.

            Olhar as pessoas é descobrir – e respeitar – o mundo que há nelas. Não importa quem seja o teu interlocutor, olha nos olhos, fala com a percepção de que, diante de ti, está um ser humano. Lamentavelmente, as pessoas se falam como se estivessem se dirigindo a uma parede e a resposta é de igual padrão: olham sem ver. E não é somente na rua! Dentro da mesma casa, pais e filhos não dialogam, aliás, mal se encontram, pois quando um sai, o outro dorme, quando um está dormindo, o outro chega, e no meio da família tem a atenção e o tempo dedicados ao computador, à internet, à televisão e ao celular, sem contar estudo e trabalho.

            Homens e mulheres se olham, mas não se veem também, e a insensibilidade grassa nas relações. Muito pior do que reclamar que o marido não viu que a esposa cortou os cabelos, é não conhecer a fundo aquele com quem divide cama e mesa, e com quem pensava compartilhar dias, vida e futuro. Existem casais que sequer se falam, mas vivem sob o mesmo teto de ausência. Não se separam, mas não estão juntos. Coabitam a infelicidade conjugal até que a morte os separe ou que um se encoraje a tomar uma decisão a favor de ambos.

            Nas empresas, órgãos, entidades e instituições, os colegas se conhecem? Com as exceções que confirmam essa realidade, não. Passam o dia inteiro em uma sala comum, mas jamais se visitam. Tampouco sabem como os outros vivem, se são felizes e o que querem para o seu amanhã. Recomendam que seja assim para não haver mistura entre o que é estritamente profissional e o que se circunscreve ao âmbito pessoal, mas trabalhar em um ambiente que oscila entre a indiferença e a hostilidade é extremamente funesto, além de estressante. Vestindo a armadura dos insensíveis, sobrevive-se a isso, olhando tudo e todos sem os ver.

(*) Crônica publicada na edição de 6 e 7 de novembro de 2010 do jornal A Razão (www.arazao.com.br) de Santa Maria, RS.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Não inventa moda, guria!

Vera Pinheiro

Quando eu era uma guriazinha e morava com minha mãe, ela costumava repreender meus arroubos exacerbados de criatividade, dizendo: “Não inventa moda, guria!”. Ou seja, puxava o freio de mão para que eu não andasse em alta velocidade nos meus quereres. Não adiantou muito. 

Hoje, literalmente, invento moda, inclusive a de viver do meu jeito, tudo do modo como dizem ser: a minha cara! E para falar não exatamente de moda, mas de comportamento em relação a roupas e acessórios, criei a “Vitrina de rua”, o blog (http://vitrinaderua.blogspot.com/). Estou adorando tudo isso! Costumo falar com as pessoas, dizer que gosto do que elas vestem ou usam, e algumas se espantam. O que mudou é que antes eu apenas elogiava, agora peço licença para publicar uma foto.

E por que não dizer? E por que não mostrar? Afinal, a gente se arruma, primeiro, para se sentir bela e feliz; depois, para se exibir aos outros. É ótimo quando alguém nota e elogia.

E eu continuo inventando moda e reinventando a vida!

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Mais um blog!!!!

Vera Pinheiro

No próximo domingo inauguro mais um blog!
É o "Vitrina de Rua" (http://vitrinaderua.blogspot.com), com uma proposta de mostrar estilos e personalidades por meio de roupas e acessórios usados nas ruas, onde eu estiver com a câmera fotográfica em mão.
Fiquem de olho nas imagens que o meu olho mágico vai capturar.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Amor engorda

Vera Pinheiro

Andando pelo shopping (incrível como o ser humano muda!), encontrei amiga minha a quem não via há apenas um mês e meio, se tanto. Quase não a reconheci, tão magra estava. Invejavelmente magra, acrescente-se. Magra e linda! Magra e saudável! Magra e feliz da vida! Também, pudera, quem não fica feliz com cinco quilos a menos, justamente aquele sobrepeso que academia não resolve nem jejum dá jeito? Pois ela me deu a receita.

-         Foi uma desilusão amorosa, amiga!
-         Como é que é?, perguntei, curiosa para saber dos quilos a menos e do namoro desfeito, uma combinação perfeita.
-         Larguei aquele &*@#$&*@+* e emagreci deste jeito, o que prova que amor engorda!
-         Engorda mesmo! A gente come demais e errado para compensar os desencantos da relação e quando percebe está do tamanho de um caminhão cargueiro! Mas, me conta, estás bem de saúde?
-         Estou ótima, cada vez melhor! Foi abandonar aquele cretino que mudei totalmente a alimentação. Agora realmente tenho cuidado com o que boto na boca! Literalmente!
-         Entendo, entendo. Fizeste muito bem, estás maravilhosa! Foi difícil?
-         Muito menos difícil do que eu pensava.
-         Jura?
-         Sim. Foi fácil como jamais supus que fosse! Ainda que a decisão de terminar o namoro tivesse sido minha, perdi a fome nas duas primeiras semanas. Comia bem pouquinho.
-         Comigo desilusão amorosa não funciona para emagrecer. Não perco nem o sono, tanto menos o apetite!
-         Dei um pontapé na bunda dele e entrei num período de luto por 15 dias. Uma espécie de viuvez voluntária... e curta! Aí, quando vi que tinha emagrecido, me animei e mudei completamente a alimentação! Foi um sucesso! Em vez de lanchar um salgado, como uma fruta, troquei as bobagens por algo saudável, diminuí os carboidratos e aumentei o consumo de verduras e legumes. E malho, claro.
-         Maravilha! Estou admirada da tua determinação!
-         E assim tem de ser, amiga. Olhei para o espelho, vi o quanto sou bela e o quanto fico melhor quando me amo, me cuido e faço o melhor por mim, tirando da minha vida quem ou o quê me prejudica ou põe pra baixo!
-         É isso mesmo! Parabéns!
-         Não tem coisa melhor do que autoestima!
-         Não tem mesmo!
-         Olhar-se com carinho, fazer as melhores escolhas por si mesma e não se contentar com relacionamentos insatisfatórios exige uma tomada de decisão, mas, quando a gente faz, renova as forças e o amor próprio.
-         Nada como uma desilusão amorosa para ensinar isso.
-         É. Há muitos caminhos para o aprendizado!

Essa amiga minha está numa grande fase. Que bom. Libertou-se de um fardo e livrou-se de quilos de dissabores. Lá vai ela, linda, poderosa e carregada de sacolas com roupinhas PP, 38 etc e tal... Essa é a parte mais divertida da história em que a alegria de viver faz o final feliz.

Acho que eu preciso de uma desilusão de amor urgente para perder uns quilinhos... O problema é que, para isso, eu precisaria – antes – ter uma ilusão de amor. Não é o caso, mas não lamento. Vou comer fazendo boquinha de peixe e malhar pesado.